Um dos desafios da nossa sociedade está relacionado com a produção e uso de
energia. Essa, possivelmente, é a grande crise estrutural que ameaça em
particular o nosso continente.
As restantes mega crises, como as crises climáticas, de biodiversidade, da transição
digital, e outras, são crises que apenas podemos resolver integrados numa
mudança universal e são comuns ao resto da humanidade (pelo menos à parte
civilizada da mesma). Nesses outros casos, temos, portanto, aliados.
A crise energética é diferente. Perante a crise energética, a União
Europeia está sozinha, tem as restantes geografias como ávidas fornecedoras e
não produzimos o suficiente. Estamos dependentes de países terceiros do norte
de África, da península Arábica, da América do Norte, da Noruega e da Rússia…
Entre aliados e não-aliados, a nossa dependência é evidente. Portanto, estamos
sozinhos e não podemos resolver a crise energética… Ou podemos?
Mais relevante do que remoer o que deveríamos ter feito no passado para nos
termos libertado da dependência, é pertinente tentar planear um futuro melhor.
Aprende-se com o passado, certamente, mas olha-se para a frente, enfrentando a
tempestade, com o vento e a salmoura batendo na cara dos audazes!
Nesta perspetiva, penso que há três vetores essenciais e que se entrelaçam.
Há que (1) aumentar a eficiência, (2) reduzir e alterar o consumo e (3) aumentar
a produção alternativa de base local. Neste artigo vou-me focar em aspetos
muito concretos da redução e alteração do consumo.
Como dizia um velho Índio, “não se usa o que não se tem”. Não temos
energia, não usamos energia. Parece fácil até certo ponto... Nos países do
norte da Europa, quando a temperatura desce abaixo dos zero graus, não há nada
a fazer. É mesmo preciso consumir energia e muita energia.
No entanto, há passos relativamente simples e que não tiveram o eco social
que deviam, na minha opinião. Por exemplo, há questões importantes e tão
simples que chegam a ser revoltantes. Qual a razão para a iluminação pública se
manter durante toda a noite? Na minha rua, tanto no Corvo, na Horta, em Lisboa,
como em Bruxelas e no Luxemburgo, a iluminação permanece activa durante a
noite. Para quê?! Estão a iluminar o caminho aos besouros?! Não seria muito
mais simples haver sensores de movimento que ligavam a iluminação quando
necessário? Há que criar incentivos governamentais e parcerias com empresas do
sector privado para facilitar a implementação de novas abordagens. Por exemplo,
realizar um concurso público em que o resultado fosse o pagamento de metade das
economias energéticas geradas por privados na iluminação pública. Seria
arrojado!
Nalguns casos, vá lá, pelo menos reduz-se o total de iluminação noturna. Os
candeeiros públicos são colocados em modo de baixa iluminação a partir de certa
hora e voltam a ser ligados antes da alvorada por uma ou duas horas. Menos mal.
Mesmo assim, algumas pessoas argumentam, e bem, que a iluminação pública é
também um factor de segurança e conforto. Concordo. Para resolver isso poderiam
ser instalados interruptores remotos. Ou seja, no período nocturno, as luzes
permaneciam desligadas e qualquer um poderia responsavelmente acender uma luz
pública que lhe parecesse relevante em determinado momento através de um
simples comando no telemóvel. Não seria certamente mais dispendioso do que
manter as luzes ligadas a noite inteira…
Há ainda uma outra interessante ferramenta que é iluminar por antecipação
de movimento. O que acontece neste caso é que as ruas estão iluminadas nos
extremos e as restantes luzes ligam-se quando uma viatura aí entra. Como os
carros circulam lentamente nas zonas urbanas, esta é uma estratégia que resulta
em certas situações. Há que fazer as contas…
São tantas as estratégias e ferramentas quantas as situações de uso de
energia. Basta olhar e pensar um pouco para encontrar estratégias de redução do
uso. Neste artigo, limitei-me a mencionar a redução da iluminação pública.
Falta tanto… Desde os transportes (públicos ou não), o planeamento, passando
pela produção e tantos tipos de consumo. Por exemplo, o teletrabalho fará
sentido? Haverá que promover ainda mais a eficiência energética dos edifícios?
Incentivar exponencialmente as energias alternativas? Refazer o planeamento
urbano para contar com as questões energéticas? Qual o papel da digitalização e
da economia verde para promover a eficiência energética? Como implementar as
chamadas “smart grids”? Como promover a mobilidade elétrica? E o mercado
de Carbono e de energia renovável? Que fazer com a energia nuclear? No caso dos
Açores, como aumentar a produção geotérmica em São Miguel e Terceira e como a
iniciar no Faial, Pico e São Jorge?
Há que incentivar a participação e a consciencialização das comunidades
locais, promovendo campanhas de educação e engajamento para as questões
energéticas. Há que estimular a multilateralidade que quebre o isolamento
europeu. Há que analisar e fazer muito melhor. Está ao nosso alcance!
* Frederico Cardigos é biólogo marinho no Eurostat. Este é um artigo de opinião pessoal. As ideias expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do autor e podem não coincidir com a posição oficial da Comissão Europeia.
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