Num destes dias, num convívio com colegas de trabalho, fiquei ainda mais perplexo com a distância cultural existente entre as diferentes pessoas. No contexto laboral das instituições europeias, a distância geográfica do local de origem é uma determinante que condiciona a língua, os valores e as referências culturais. Até aqui, tudo normal e, como já várias vezes o escrevi neste espaço, estas diferenças fascinam-me. O que não estava à espera, eventualmente apenas porque nunca tinha pensado nisso, foi na distância cultural motivada pela diferença geracional.
Estando encarregue da seleção
musical deste convívio em particular, pedi aos colegas que me enviassem
sugestões. A maioria, como resultava da minha solicitação, enviaram-me
propostas que espelhavam a sua origem, as suas tradições e os seus costumes. Os
mais jovens, por outro lado, detiveram-se mais nas músicas da moda que, apesar
de não apreciar particularmente, respeitei. Tanto um conjunto como o outro,
integrando as músicas do meu próprio gosto ou as que considerava adequadas para
motivar a alegria e o convívio, constituíram a seleção final. Passámos uma
tarde bem engraçada, entre conversa, gargalhadas e dança. Foi bom.
No final, enquanto se arrumava e
limpava o espaço, tropecei num conjunto de músicas que tinha selecionado para
um outro fim. Eram melodias rock e pop dos anos 70 e 80, aquelas que fizeram a
transição entre a geração dos meus pais e a minha. Cure, Talking Heads e Elvis
Costello eram alguns dos protagonistas das músicas que agora, em fim de festa,
eram apreciadas pelos mais idosos (como eu…) e ouvidas com curiosidade pelos
mais jovens.
Foi então que entendi! Estes
jovens não faziam a menor ideia de quem estava a tocar. Não conheciam as
músicas, as suas histórias, a sua beleza, o seu contexto e, nalguns casos, nem
os nomes dos grupos ou dos artistas. Nada lhes diziam. São pessoas
espetaculares em termos de valores e competência, mas, em termos de música
“antiga”, sabem muito pouco.
Eu lembro-me que, no meu tempo,
conhecíamos os ídolos musicais dos nossos pais e, gostando ou não, tínhamos de
ouvir. Jamais alguma das pessoas da minha geração pensou ser possível não
reconhecer de imediato e aos primeiros acordes as músicas dos anglófonos Beatles,
Janis Joplin ou Buddy Halley, dos francófonos Edith Piaf ou Jacques Brel (que
muito apreciava o Faial) ou dos grandes nomes da música erudita. Conhecíamos
porque gostávamos, é certo, mas também porque, caso falhássemos na sua
identificação, seríamos benevolamente humilhados nos jantares de família e
acariciados com mimos do tipo “Estes jovens, não sabem o que é bom…”. E, na
realidade, com um percalço ou outro, conhecíamos muito razoavelmente o contexto
musical dos nossos pais.
Hoje não é assim. Seja o
resultado de um maior distanciamento entre os novos jovens e os seus pais
(vítimas dos jogos de vídeo, redes sociais ou outros), o que é certo é que
pouco sabem. Coloquei uma das faixas mais conhecidas do álbum Dark Side of the
Moon dos Pink Floyd e nada. Não lhes dizia nada! O “Money for Nothing” dos Dire
Straits é, para estes jovens, uma sonoridade absolutamente nova. Como é
possível?!
Mais do que ter alguma pena ou
desgosto, no entanto, o meu sentimento prevalecente é uma certa inveja, admito.
Para eles, é tudo novo! Lembro-me de ser miúdo e ouvir nas escadas da entrada
do meu ciclo preparatório as músicas de Rock Português que então despontavam. A
nossa curiosidade, perplexidade e satisfação coletiva perante cada lançamento
enchia-nos de uma alegria sem dimensão e que, ainda hoje, vou procurando em
cada música que me chega aos ouvidos. Estes jovens de hoje têm um enorme mundo
para descobrir a partir do momento em que se aventurem a ouvir tantas coisas
bonitas. Ou será que estes novos jovens serão os primeiros a contrariar a Elis
Regina quando cantava “Ainda somos os mesmos e vivemos, Como os nossos pais”?
* Frederico Cardigos é biólogo marinho no Eurostat. Este é um artigo de opinião pessoal. As ideias expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do autor e podem não coincidir com a posição oficial da Comissão Europeia.
Sem comentários:
Enviar um comentário