Sendo um entusiasta de estatísticas e do espírito olímpico, os jogos de Paris 2024 foram uma boa justificação para “brincar” com números. No movimento olímpico, as medalhas são a expressão visível do sucesso de cada desportista e de cada país. Por esta perspetiva, os atletas dos Estados Unidos da América e da China são os que mais se destacam. Essa é uma perspetiva honesta, mas redutora.
A China e os EUA são dos países mais populosos do mundo. Tendo maior número
de seres humanos é natural que tenham também o maior número de medalhas. No
entanto, como se comprova com o exemplo da Índia, o outro dos países mais
populosos do mundo, o sucesso olímpico espelhado pelas medalhas não é apenas
resultado da população. De outra forma, a Índia teria muitas medalhas e, em
Tóquio 2020, teve apenas 7; muito pouco se comparada com a China, um país com
população semelhante e que obteve 89 medalhas.
Ou seja, aparentemente, há outros fatores que determinam o sucesso
medalhístico para além da população. Este não é um tema novo e já diversos
autores se debruçaram e, com mais engenho que eu, certamente chegaram às
melhores conclusões. Para esses estudiosos, o fator que mais contribui para o
sucesso medalhístico para além da população é o produto interno bruto. Apesar
de compreender as razões, resolvi continuar a brincar com os números e tirar as
minhas conclusões.
Comecei por elencar um conjunto de fatores que gostaria que estivessem
relacionados com este sucesso e outros que me pareciam poderem estar
relacionados. São duas coisas diferentes: o que eu gostaria e o que me parecia...
Por exemplo, eu gostaria que o sucesso nos jogos olímpicos estivesse
relacionado com o sucesso escolar, com o índice de desenvolvimento humano e com
o estado da democracia. Ao mesmo tempo, considerei que, possivelmente, o
sucesso medalhístico poderia estar relacionado com o número de atletas que cada
país apresenta na competição, com o já mencionado produto interno bruto e com o
investimento nacional feito no desporto. Portanto, estas foram as minhas
variáveis de base.
Para realizar os cálculos, recorri a um sistema de inteligência artificial.
Pedi-lhe para ajustar uma equação polinomial ao número de medalhas por milhão
de habitantes obtidas nos Jogos de Tóquio aos fatores acima mencionadas. Não
usei os Jogos de Paris porque fiz o trabalho durante a competição e porque
queria usar o resultado para comparar com esta última competição. Para
simplificar, usei apenas as medalhas de ouro e apenas países em que todas as
variáveis fossem conhecidas. Isto é uma limitação, já que nem todos os países têm
disponíveis índices como o sucesso escolar (usei os testes PISA).
Portanto, muita conversa para dizer que me esforcei para obter algum
resultado que fizesse sentido, mas este é assumidamente um trabalho amador.
Quando cheguei ao final fiquei contente por duas razões. Primeiro, o índice de
ajustamento da equação era elevado (r2=0,85) e, em segundo, havia
fatores mais correlacionados e outros menos correlacionados com o sucesso
medalhístico.
De acordo com os meus cálculos, o fator que mais se correlaciona com o
sucesso nos Jogos Olímpicos é o índice de desenvolvimento humano. Seguem-se o
investimento em desporto e o número de atletas em competição. Em sentido
contrário, a educação, a democracia e o produto interno bruto parecem não ter
influência assinalável no sucesso medalhístico, de acordo com os meus cálculos
superficiais e amadores.
Para tirar a prova à minha equação feita com base nos Jogos de Tóquio,
calculei os resultados para Paris. Entre os diferentes resultados, de acordo
com a minha equação, os Estados Unidos teriam 39 medalhas de ouro (tiveram 40),
a China teria 38 (40), o Japão 27 (20), a Austrália 17 (18) e Portugal 2 (1). Não
estive muito longe. Não refiro os restantes resultados, mas apenas um dos piores.
Trata-se da França. De acordo com a minha equação, a França deveria ter tido 55
medalhas de ouro e, na realidade, teve 16. Lá se foi a boa reputação da minha
equação…
Concluindo, é certamente impossível obter uma equação que pré-determine o
sucesso nos jogos olímpicos. No entanto, o aumento do índice de desenvolvimento
humano, de acordo com os meus cálculos, e o aumento do produto interno bruto,
de acordo com os cálculos de quem sabe realmente do assunto, parecem acompanhar
o sucesso olímpico. Acima de tudo, foi divertido brincar com os números.
* Frederico Cardigos é biólogo marinho no Eurostat. Este é um artigo de opinião pessoal. As ideias expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do autor e podem não coincidir com a posição oficial da Comissão Europeia.
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