Dia 13 de Novembro de 2002 o navio de transporte de hidrocarbonetos "Prestige" emitiu uma mensagem de socorro. Iniciou-se aí uma saga de acontecimentos, dos quais o pior terá sido a Maré Negra que insiste em fustigar as costas da Espanha e França. Portugal, miraculosamente, parece passar ao lado de grande parte desta desgraça.
Curiosamente, desde dia 13 de Novembro que todos perceberam o que se iria passar a seguir. Parecia inevitável. Todos compreenderam menos o Governo Espanhol e o Governo da Xunta de Galicia. Preferiram ignorar, não dar importância ao crude que se amontava nas costas da Galiza. Agora num acto desesperado o Partido Popular vem acusar as Associações, que se criaram nesse período para lutar contra os efeitos da maré, de estarem a fazer partidarismo. De entre estas organizações, aquela que mais parece perturbar o partido do Governo Espanhol é a Plataforma "Nunca Mais". Segundo esta organização, é necessário mobilizar a opinião pública, organizando manifestações e outros eventos por forma que este tipo de acidentes não se repita. Não consigo resistir a relembrar que foram necessários 25 dias de Maré-Negra para que o Governo Espanhol enviasse 1500 militares para ajudar a combater a poluição.
O comandante do Navio "Prestige", foi recentemente, após 80 dias, libertado. A fiança para a libertação deste comandante foi de 3 milhões de euros. A caução foi a mais elevada imposta em Espanha por "delitos contra os recursos naturais e o ambiente, em desobediência às autoridades administrativas" e foi paga pela seguradora London Steamship Owners Mutual Insurance Association. Oxalá alguma instituição fosse tão rápida a pagar os danos ambientais que este navio causou... Aliás, por falar nisso, a FIPOL (fundo internacional de indemnizações para os danos provocados pelos hidrocarbonetos), organismo criado pela Organização Marítima Internacional para complementar as escassas indeminizações atribuídas pelas seguradoras e donos dos navios, já decidiu que não irá pagar qualquer indemnização até Maio. Segundo este organismo, apenas possui 180 milhões de euros disponíveis e só os danos estimados das limpezas que estão a decorrer em Espanha ascendem a mil milhões de euros. Então para que serve o FIPOL se não tem recursos ou se não os consegue mobilizar? Houve apenas um caso de Maré Negra em que as indemnizações foram total e prontamente pagas. Tratou-se do caso Exxon Valdez, que danificou uma zona da costa do Alasca. Curiosamente, os Estados Unidos da América não fazem parte do FIPOL.
A boa notícia é que o "Nautille", esse pequeno-gigante submarino Francês conseguiu fechar todas as fissuras do petroleiro "Prestige". Não se crê que isso impossibilite totalmente a libertação de fuel, mas, certamente, irá reduzir em muito o caudal de saída. É, por isso, importante que o "Prestige" seja monitorizado periodicamente de forma a verificar as selagens e certificar que não há novas fissuras. Esperemos que quando se falar novamente em títulos atribuídos pelo Presidente da República não se esqueça a tripulação deste submarino e restantes colaboradores do IFREMER. É que eles, aparentemente, ajudaram, em muito, Portugal a livrar-se do grosso de uma maré negra que era previsível para quando as correntes dominantes invertessem o seu sentido. Até ao momento em que escrevo este artigo, apenas pequenas manchas atingiram a costa portuguesa.
Outra boa notícia é que já foi possível abrir parcialmente a pesca na zona das Rias Baixas, Galiza. Ainda é apenas uma pequena parte, mas é uma esperança de que, no futuro, se possa voltar à normalidade.
O Comité Científico do "Prestige", liderado por Emilio Lora-Tamayo, deu ao Governo Espanhol uma lista com 15 soluções definitivas para este navio. Espera-se que uma dessas soluções possa ser aplicada no próximo Verão. É que o "Prestige" ainda tem cerca de 50 toneladas de crude dentro dos seus depósitos. Entre as soluções que foram apresentadas contam-se: enterrar o navio debaixo de cascalho e argila, construir um sarcófago de betão ou metal, queimar o fuel-óleo ou re-emergir o petroleiro. Para algumas destas soluções não existe ainda tecnologia capaz de responder às necessidades.
Ainda de entre as soluções apresentadas, "Os Verdes" apresentaram uma proposta para afastar o tráfego de navios perigosos a menos de 20 milhas da costa.
Algumas instituições de investigação encontram-se a fazer experiências para determinar a eventual capacidade das bactérias marinhas de grande profundidade em degradarem os hidrocarbonetos libertados pelo "Prestige". Serão boas notícias se os hidrocarbonetos realmente se degradarem e se se conseguir isolar os microorganismos responsáveis por essa acção. A partir daí, levantar-se-ão novas perspectivas que possibilitem a degradação com a ajuda do Homem dos hidrocarbonetos do navio afundado.
Já foi anunciado que Jean-Yves Costeau e James Cameron, cada um por seu lado, irão fazer documentários sobre o "Prestige". É de esperar que o filho do Comandante se detenha mais sobre os pormenores ecológicos e sociais, enquanto o cineasta norte-americano irá certamente aproveitar a tecnologias que tão bem domina para transmitir a dimensão do espectáculo diabólico que o navio poderá proporcionar. James Cameron já anunciou que irá utilizar a tecnologia IMAX para dar ao documentário um maior realismo.
Publicado na coluna "Casa Alugada"