sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Crónicas de Bruxelas: 59 - Não no meu turno

Edifício Berlaymont da Comissão Europeia com a colocação do banner de Ursula Von der Leyen.
Foto: Roberto Pacheco

Ao terminar a vigência da Comissão Juncker e ao iniciar-se o turno da Comissão presidida por Ursula Von der Leyen (VDL) é natural fazer-se um balanço sobre o período que terminou e ensaiar um pequeno prognóstico dos desafios que aí virão. Nada como refletir sobre as conquistas e derrotas para se poder ajudar a fazer um ainda melhor futuro.

Entre as vitórias da Comissão Juncker, eu destaco ainda haver União Europeia. Pode parecer surpreendente escrever uma coisa destas, mas é bem verdade. Desde que Jean-Claude Juncker (JCJ) tomou posse que se alvitra que a União não irá sobreviver. Primeiro foram as crises nos países do sul da Europa, com a Grécia à cabeça, mas com Portugal fazendo parte do grupo, depois foi o terrorismo, refugiados e as migrações, a seguir a eleição de Trump e, finalmente, mas não menos difícil o Brexit.
De cada uma destas situações, a Europa jamais iria sair ilesa. Para espanto, cá estamos! E estamos cá porque, na minha opinião, a Comissão Juncker soube criar pontes, sinergias e ser infinitamente paciente. São boas virtudes e deram resultado.
Claro que pouco podemos dizer de animador às vítimas de todas as crises mencionadas atrás. Mas se ainda existimos enquanto comunidade unida e coesa, eu penso que isso se deve, em grande parte, à argúcia de Jean-Claude Juncker e, obviamente, dos seus comissários.
Jean-Claude Juncker, no entanto, não se livra de, na sua vigência, pela primeira vez, ter havido uma redução no número de Estados Membros da União. Muitos dirão que, realisticamente, o Reino Unido nunca esteve bem na União e, os mais meticulosos, dirão que o Reino Unido não sairá na vigência de JCJ, mas já nos tempos de VDL. Optimista como sou, prefiro pensar que a União Europeia, ao deixar pacificamente sair um dos seus Estados realça a sua natureza não beligerante e isso não é despiciente. Imaginem o que seria a Califórnia a abandonar os Estados Unidos da América ou a Chechênia sair da Federação Russa? Não, não é imaginável. Somos uma União pacífica de Estados e isso causa-me orgulho.
Através de um referendo condicionado por mentiras propagadas pela Cambridge Analyctica e outros, o Reino-Unido decidiu sair da União Europeia. Desde que essa decisão foi tomada, os sucessivos governos britânicos tentam estabelecer acordos com a União Europeia que incluam formas para continuar a usufruir de benefícios como no caso da Pesquisa e Desenvolvimento, programa Erasmus, entre outros. Atenção, não me parece mal. O multilateralismo (i.e. vários Estados tomam decisões em conjunto) é um precioso conceito e as sinergias resultantes da participação do Reino Unido serão benéficas para todos.
Voltando à questão inicial. O balanço da Comissão Juncker é positivo ou negativo para a União? Em termos territoriais, a União reduziu-se. E em termos financeiros? Em termos financeiros o resultado também é negativo.
Neste momento discute-se qual o orçamento para 2021-27 e há três aproximações possíveis: a proposta do Parlamento Europeu, com 1,3% do Rendimento Nacional Bruto de cada país, 1,08 a 1,11%, a proposta da Comissão, e de 1,06 a 1,07%, a proposta do Conselho. No período anterior, de que beneficiou Jean-Claude Juncker, era entre 1,24 a 1,31%. Ou seja, muito provavelmente, os recursos financeiros postos à disposição de VDL serão inferiores ao que esteve disponível anteriormente.
Claro que me poderão dizer que, no seu turno, JCJ foi uma vítima das circunstâncias e que, perante os desafios que lhe foram colocados, até se saiu muito bem. Podem dizer e até terão alguma razão, mas, para mim, quem perde em termos territoriais e em termos financeiros não pode ser considerado um vencedor. Ainda temos União Europeia, o que é bom para os 27 Estados-membros. Foi o possível.