sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Responsabilidade

Artefacto com interesse cultural encontrado no Porto da Horta
durante a prospecção arqueológica associada à construção do novo molhe.
Foto: F Cardigos SIARAM

Rezam os pergaminhos ecologistas que, a par de uma sociedade democrática, deve-se assentar o progresso no desenvolvimento sustentável. Isso significa, segundo está estabelecido, que os aspectos ambientais, sociais e económicos devem estar a par e não são hierarquizáveis. Ou seja, não é possível sacrificar o ambiente a favor de um maior rendimento (economia) ou de um maior índice de emprego (sociedade) ou vice-versa. Segundo este modelo, são as instituições que devem garantir a sua aplicação.
Invariavelmente, tentar corromper um destes pilares acarreta uma factura a pagar no futuro. Há diversos exemplos de como se entra num clima de estabilidade quando é respeitado o desenvolvimento sustentável e, por outro lado, como as sociedades regridem, declinam ou mesmo se auto-aniquilam quando tentam favorecer um dos pilares.
Desde o momento em que foram aprovados para uso planetário, o que aconteceu na Cimeira do Rio em 1992, os pilares do desenvolvimento sustentável têm sofrido algumas adaptações conforme o interesse ou a abordagem, mas, passado pouco tempo, volta-se à sua fórmula fundamental. É difícil, de facto, chegar a um novo conceito tão simples e tão eficiente como o do desenvolvimento sustentável na sua versão original. Para mais, é um conceito que ganhou aceitação global.
Recentemente, numa Cimeira organizada em Lisboa, chegou-se ao entendimento que era essencial criar um novo pilar relacionado com a Cultura. A Cultura está, por enquanto, inserida no pilar Social, mas, defendeu-se e com razão, que os aspectos culturais são demasiado importantes para que não tenham uma ênfase particular. Apesar de entender e ser solidário, tenho dúvidas que se alcance um novo entendimento que seja tão abrangente e consequente como aconteceu na fórmula original, dado o seu enorme sucesso. Independentemente das consequências, é importante destacar os aspectos culturais como prioritários, principalmente num planeta em conformação, formatação e uniformização galopantes. Um dos melhores atributos que a humanidade tem e que lhe deu uma enorme capacidade de adaptação é a diversidade. Com a imposição do inglês como língua franca, duas ou três religiões dominantes e duas unidades monetárias (dólar e euro), torna-se difícil manter a diversidade.
Na Cimeira de Joanesburgo, tentou-se aperfeiçoar a componente da responsabilidade e às Instituições, vistas no sentido governativo, acrescentaram-se os cidadãos e as empresas. Com este interessante passo, tentou-se expressar a importância das grandes empresas em relação à situação global. O resultado é interessante e, caso tenhamos esse trabalho, verificaremos que hoje em dia, qualquer grande empresa tem um gabinete ou serviço dedicado a esta extensão. Fiz o teste e reparei que a maior empresa do mundo em bebidas com cola, logo na entrada do seu ecrã principal na internet, faz um apelo ao salvamento dos ursos polares. No site de uma enorme empresa de telemóveis havia uma ligação para o Ambiente em que, de uma forma brilhante e intuitiva, eram demonstradas as preocupações ambientais daquela empresa. No caso de uma companhia de pastas de dentes, para além de uma ligação ambiental, também havia um código de conduta que expressava as preocupações da empresa a nível ambiental e social. Ou seja, parece-me que as preocupações com o desenvolvimento sustentável a nível institucional e empresarial estão a ter consequência. No caso das empresas, parece-me ainda estar demasiado orientado para a sua auto-promoção, mas pode ser uma impressão minha.
Agora, mais importante ainda, e com um longo patamar de evolução está o envolvimento individual. De facto, a nossa responsabilização para com o desenvolvimento sustentável ainda tem um longo percurso pela frente. Estas palavras, apesar de estarem a ser repetidas por mim e com total solidariedade, foram ditas há poucos dias pelo Presidente do Clube de Roma, Dr. Ricardo Diez-Hochleitner, com enorme emoção. Segundo ele, “é impensável estarmos perante um momento em que sabemos quais são os problemas, temos as soluções tecnológicas, temos dinheiro para os investimentos e não os fazemos apenas porque estamos demasiado confortáveis a não pensar nesses assuntos”. Não podia dizer melhor. É tempo de, enquanto cidadãos, exigirmos e empenharmo-nos para que sejam dadas respostas que invertam o aquecimento global, a perda de espécies, o incremento das bio-invasões, a fome que grassa por grande parte do planeta, a diminuição radical da mortalidade infantil, etc., etc… Se falharmos, falhamos todos, portanto, o empenho tem que ser de cada um. Temos tudo para ser felizes, basta apenas que haja empenho e que este seja global!

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Quanto vale o Mar dos Açores?

É na interface terra-mar que estão grande parte dos valores conhecidos no mar dos Açores.
No entanto, é para lá do horizonte que está o final deste arco-íris.
Foto: F. Cardigos SIARAM 


Há uns dias atrás, na sequência da preparação de uma peça de suporte ao Fórum da Economia do Mar [*] promovido pela Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada, uma jornalista de uma rádio regional fez-me esta pergunta: “Quanto vale o Mar dos Açores?”. Apanhado, pois nunca tinha pensado de forma tão crua, escusei-me a responder e prometi que iria pensar no assunto.
Debati-me, literalmente, com a questão. Sendo responsável pela gestão do Domínio Público Marítimo e Assuntos do Mar dos Açores, eu tinha de saber quanto valia o que estava a gerir, mas não fazia ideia da resposta. Sabia, como todos sabemos, alguns dos parciais, como os relacionados com as pescas [p. ex. *], e, também, que o total é elevado e que há muito ainda por explorar [p.ex. *]. Também tenho clara consciência que, provavelmente, nunca se saberá o valor exacto dada a complexidade do tema. No entanto, para mim, esta era uma resposta de mau perdedor. É difícil admitir tal fraqueza e, portanto, resolvi de imediato meter mãos à obra.
Comecei por uma questão muito simples e, logo aí, obtive duas respostas. Fui verificar, com a ajuda dos colaboradores da direcção regional, quanto vale a extracção de areias marinhas nos Açores. É um tema cujo licenciamento é feito por nós, temos os relatórios de descarga, sabemos a quanto é vendida a areia e, portanto, tudo estaria bem. Fizemos as contas e deu um milhão e oitocentos mil euros por ano. Excelente! … mas… “Podia ter sido extraída mais”, retorquiu-me a colaboradora que fez as contas. “Podiam ter vendido até 3,5 milhões de euros, já que era esse o limite ambientalmente definido”. Ou seja, no caso mais simples, já temos dois valores e ainda não pensamos na economia de escala, causada pelo benefício na construção civil, nos empregos directos de quem trabalha na actividade, e nos indirectos, de quem mantém os barcos, os abastece, etc. Estamos no tema mais fácil e já temos todas estas dúvidas e uma miríade de variáveis.
Resolvemos então elencar todas as actividades que se realizam no mar dos Açores e que geram proveitos económicos. Chegamos à conclusão que existem seis grandes grupos: 1. Recolhas (que incluem os diferentes tipos depesca e aquacultura), 2. Extracção (areias), 3. Transportes [*] (pessoas, cargas, informação e estruturas de suporte), 4. Turismo (com todas as suas vertentes), 5. Ciência (básica e aplicada à farmacologia, biotecnologia, tecnologia azul e robótica submarina) e 6. Cultura (enquanto fonte de inspiração e cenário para História e estórias). Este foi o esquema simplificado a que chegamos e onde tentámos depois encaixar as novas valências emergentes e que incluem a extracção de minerais, o suporte para a produção e transferência de energia entre ilhas e continente e o abastecimento a navios em trânsito. Um aparte para referir que o abastecimento de navios em trânsito é especialmente importante quando estão a mudar as rotas, resultante da ampliação do Canal do Panamá, e os tipos de combustíveis estão progressivamente a ser alterados para fórmulas mais limpas, incluindo a utilização de gás natural. Este combustível exige abastecimentos mais frequentes e isso obrigará a que se faça um maior número de acostagens em cada viagem (incluindo as transatlânticas).
Como é fácil verificar, não é nada fácil contabilizar os dividendos que advêm ou poderão resultar da optimização da exploração marinha. Apesar disso, é um esforço que tem de ser feito e será nisso também em que irei trabalhar nos próximos dias. Espero ter algumas respostas interessantes.
Entretanto, no Fórum da Economia do Mar, durante as palestras propriamente ditas, fiquei a saber que no Continente também não sabem qual é o valor do mar e, curiosamente, estão, também a tentar descobri-lo. Para isso, contrataram uma equipa universitária especializada. Como este estudo inclui a totalidade do território nacional, daí também teremos valores para os Açores.
O que acabei por responder à senhora jornalista é que, com todas estas realidades e oportunidades, “o mar é uma excelente saída para uma crise que insiste em nos acompanhar. Apenas necessita de imaginação, coragem e competência.” Vamos a isso?!