quarta-feira, 11 de julho de 2012

O regresso da minha Europa


Para muitos, o ilhéu de Monchique, na ilha das Flores, Açores,
simboliza o extremo ocidental da Europa.

Pode ser um pouco lamechas, e provavelmente é, mas eu sou daquelas pessoas que sente um arrepio e um aperto na garganta quando houve o quarto andamento da nona sinfonia de Beethoven, que se maravilha com o engenho de Da Vinci e que reconhece o brilhantismo comunicativo de Dali, como se estivesse imbuído de um vasto continuum cultural. Eu sou Europeu!
Apesar disso, não sou um Europeu de qualquer Europa. Quando a Europa se porta mal, e tem uma enorme tendência para se portar mal, distancio-me e fico a olhar para a minha alma lusitana, refugiando-me numa qualquer paisagem bucólica de uma ilha das Flores envolta em nevoeiro. A minha Europa tem valores, compaixão, imaginação, engenho, solidariedade e coragem. A Europa a que eu pertenço estende-se do ilhéu de Monchique aos Urais, de Svalbard a Gibraltar e recusa os totalitarismos, os egoísmos, as intolerâncias e a cobardia. A minha Europa é ainda muito mais bonita do que a Europa da mitologia grega.
Depois da guerra da Jugoslávia, pensava, como outros pensaram no final da primeira grande guerra, da segunda grande guerra e da queda do muro de Berlim, que à Europa teria chegado a um período de paz duradoura. Talvez sim, mas talvez não…
A recusa de tratar a Grécia como a sua história impõe (a nossa história), o autismo em relação às dificuldades sentidas por Portugal e Irlanda e o isolamento que se preparava para sitiar a Espanha e a Itália eram prenúncios de um futuro feio, um regresso a um mau passado. Felizmente, a França salvou-nos. Estranho que seja um país que historicamente contribuiu ativamente para a confusão, seja agora o garante da restauração dos valores. Contrariando-me para provar um ponto de vista, apenas poderia ser a França, esse gigante dos valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade que poderia apontar o rumo. O corolário é, portanto, que desta vez foi a França a salvar a minha Europa, tal como antes foram tantos outros; possivelmente, de acordo com cada momento, todos os outros.
De facto, a Europa é um mapa em que, em permanência, jogam as forças do bem e do mal, incluindo todos os níveis de cinzentos. Mas, porquê? Porque não é possível estar tranquilamente no nosso território sem que haja quezílias as quais, demasiadas vezes, terminam em enormes banhos de sangue? Como garantir a paz na Europa?
Gostava de ter uma resposta fácil. Não tenho.
Apenas sei que a missão é contribuir. Temos que contribuir para que, em permanência, as forças do bem prevaleçam. Há referências europeias que me norteiam, mas cada um terá as suas. Por muito que nos aborreçam as histórias de cordel e os devaneios irresponsáveis de algumas coroas europeias, ainda hoje Suas Altezas Reais a Rainha Elizabete II e o Rei Juan Carlos são efetivos lutadores pela liberdade. Estadistas como Mikhail Gorbatchev, empresários como Nobel, cientistas como Marie Curie e Albert Einstein, poetas como Fernando Pessoa, músicos como Antonio Vivaldi ou Frédéric Chopin juntam-nos numa Europa de Bem. É para eles que olho, presto uma vénia e contemplo, inspiro-me e tento, mui modestamente, seguir o exemplo. É desta Europa que eu gosto. É nos dias em que esta Europa prevalece que me sinto verdadeiramente Europeu.
De um ponto de vista mais prático, há que sair do mercantilismo cego que rege o mundo e partir para uma época mais social, em que todos tenham espaço. Obviamente, a Grécia está minada por um regime repetitivo que administra os seus destinos há demasiados anos. Mas a Grécia, como muitos outros países, sofreram golpes profundos pelas guerras do centro, viveram sob regimes totalitários fratricidas e essas não foram escolhas gregas. Portanto, como qualquer ente querido que está doente, a nossa missão é cuidar, auxiliar, orientar e, no fim, passada a mazela, festejar. Essa é a missão da Europa e a nossa missão, uma vez cumprida, será inspiradora para o mundo.

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