Por: F. Cardigos
A ponte mais conhecida de Mostar, na Bósnia- Herzegovina, e
uma das mais conhecidas do mundo dá pelo nome de Stari Most. É lindíssima! Foi
construída há muito tempo a mando de um Sultão do Islão e, para além de ligar
duas partes daquela cidade, tradicionalmente ligava as duas culturas dos dois
lados do rio.
No início dos anos 90, antecipando a divisão da Jugoslávia,
ocorreu uma horrível guerra entre os principais grupos étnicos que ali viviam.
Entre as então regiões, houve as que entraram na guerra porque tinham medo de
ser invadidas, as que entraram porque estavam a ser invadidas por esses mesmos
vizinhos e as que, fruto da sua ambição, instigaram tudo isso. O que aconteceu
é tão triste que, embora a sua descrição não caiba neste artigo, tem que aqui
ser referido como um dos momentos mais baixos da história da humanidade.
Caminhando hoje por cidades como Dubrovnik, na Croácia, custa
a crer que aquelas simpáticas pessoas odiassem tanto os conterrâneos que
encetassem uma guerra civil sem tréguas e, quanto a mim, sem nexo. Perseguir
uma pessoa porque ela não crê no mesmo Deus ou porque não fala a mesma língua
é, para mim, absolutamente impensável. Antes pelo contrário, tenho uma curiosa
atração por quem não concorda comigo. É fascinante ouvir a argumentação
daqueles que pensam de forma diferente. Eu dou entusiásticas vivas à diferença!
Em Mostar, mesmo com a guerra no seu auge, as pessoas
insistiam em encontrar-se na Stari Most. Por forma a instigar ódios, os
beligerantes resolveram colocar soldados escondidos e equipados para atirar
sobre aqueles que insistiam em ser livres e comunicar. Assim, estes snipers mataram dezenas de pessoas que
tentavam passar de um lado para o outro da cidade dividida.
Contaram-me que um jovem casal dos lados opostos se enamorou
nesse período. Apesar de conhecerem o perigo, como o amor falava mais alto,
insistiram em se encontrar na ponte e acabaram por ser cobardemente alvejados. Uma
autêntica história de Romeu e Julieta dos tempos modernos, mas com
protagonistas demasiado reais para podermos apreciar a história. Também o pai
de um deles, que apenas tentava recuperar os corpos, foi alvejado e morto.
Durante um longo período, as pessoas tentaram passar. Muitas morreram e outras
ficaram feridas, até que uma das artilharias resolveu destruir um dos símbolos
da união entre os povos dos Balcãs.
Tendo este altíssimo valor simbólico, não admira que a
primeira obra que as Nações Unidas financiaram no final da guerra tenha sido a
reconstrução da Stari Most, quando possível com as pedras originais e
utilizando os métodos de construção do século XVI. Em Julho de 2006 a ponte
reabriu ao público e está lindíssima.
Eu gosto das pontes de Mostar e em especial da Stari Most.
Para mim, ela simboliza o prevalecer do bem sobre o mal. Significa que, para a
maioria dos seres humanos, mais do que os períodos de incompreensível devaneio,
o importante é a civilização, o entendimento e o progresso assente em valores
positivos e fraternos.