Malahide, na Irlanda, é conhecida pelo seu histórico relacionamento com o mar.
Foto: F Cardigos
“Estava um turista a passear
na Jamaica quando percebeu que, provavelmente, já teria andado demais. Sentindo-se
perdido, abeirou-se da primeira pessoa que encontrou e perguntou-lhe como
poderia voltar ao povoado mais próximo. Tratava-se de um idoso de “boa onda”,
com aquele olhar calmo que apenas as pessoas nas Caraíbas podem ter. Olhou para
o turista, olhou para a estrada, lentamente, pensou, voltou a olhar para o turista
e, depois, para a estrada. Pensou mais um pouco e, finalmente, respondeu
pachorrentamente com um olhar um pouco vago e nada interessado: “Sabe,
provavelmente, este não é o melhor sítio para começar…”.
Foi desta forma humorística que o chairman do workshop da
Comissão Europeia sobre planeamento espacial marítimo dedicado à energia, que
decorreu recentemente em Malahide, na Irlanda, começou a explicar como se podem
adiar as decisões por falta de informação. No entanto, entre entidades
responsáveis, esta não é a forma de proceder. Com a pouca informação disponível
têm de ser tomadas decisões, incluindo a decisão de não fazer, que “é uma opção legítima e que muitas vezes os
planeadores esquecem”.
Num mundo pejado de decisões que, mais do que motivadas
pelas necessidades e desejos das populações, estão muitas vezes alicerçadas na
vontade de obter visibilidades fáceis ou protagonismos excessivos, cada vez
mais o cidadão comum exige calma, contenção e moderação. Se até há pouco tempo
a fatura das “obras de regime” parecia plausível, até por haver um deficit estrutural, hoje, a generalidade
das pessoas já começa a exigir saber quem é que vai pagar o investimento e quem
é que vai pagar a manutenção dos novos equipamentos. É bom que assim seja e os
planeadores da nova geração terão que ter isso em consideração. Não basta
imaginar que um determinado equipamento ficaria bem, é necessário saber quem
vai pagar, quem vai usar e quem vai manter o funcionamento. Sem estas três
questões claramente respondidas e de forma justa, penso que o refrear do
investimento se impõe.
Há uns dias atrás, ouvi um pensador português a afirmar que
tínhamos urgentemente de passar da lógica do “consumo” para a lógica da
“suficiência”. Cada um, defendia ele, tem que se perguntar a si próprio o que
lhe é suficiente e lutar por isso, mas refrear a ambição de ter o carro último
modelo ou o gadget da moda. “O mundo não aguenta mais consumo!”.
Em Malahide, tentaram encontrar-se soluções para localizar
no mar as novas unidades de produção energética que terão de substituir as
centrais nucleares alemãs e francesas. Os planeadores estão atentos, têm
soluções, mas estas têm que estar associadas a uma redução efetiva no consumo
de eletricidade na Europa. Estaremos prontos para o fazer?
Para terminar realço dois outros papéis que poderão, no
futuro, caber particularmente aos Açores no domínio da energia, são eles o
sequestro de Carbono (por captura em algas ou afundamento no mar profundo) e a
produção de hidrogénio em unidades off-shore.
É uma realidade distante, quem sabe uma visão ou mesmo um delírio, mas é de
pensamentos arrojados e libertos, associados a planeamento e trabalho, que se
constroem sociedades mais justas e avançadas.
Cada um de nós terá o seu papel neste esforço conjunto.
Temos de verificar onde estão os nossos excessos e conter. Temos de verificar
em que podemos contribuir e esforçar-nos. Não está ao virar da esquina, mas vem
aí um admirável mundo novo e, tal como aconteceu em relação à gestão de
resíduos em 2006, sinto-me honrado por estar a participar em mais esta mudança
de paradigma.
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