sexta-feira, 28 de junho de 2013

Planeando o uso do mar em Malahide

Malahide, na Irlanda, é conhecida pelo seu histórico relacionamento com o mar.
Foto: F Cardigos


Estava um turista a passear na Jamaica quando percebeu que, provavelmente, já teria andado demais. Sentindo-se perdido, abeirou-se da primeira pessoa que encontrou e perguntou-lhe como poderia voltar ao povoado mais próximo. Tratava-se de um idoso de “boa onda”, com aquele olhar calmo que apenas as pessoas nas Caraíbas podem ter. Olhou para o turista, olhou para a estrada, lentamente, pensou, voltou a olhar para o turista e, depois, para a estrada. Pensou mais um pouco e, finalmente, respondeu pachorrentamente com um olhar um pouco vago e nada interessado: “Sabe, provavelmente, este não é o melhor sítio para começar…”.
Foi desta forma humorística que o chairman do workshop da Comissão Europeia sobre planeamento espacial marítimo dedicado à energia, que decorreu recentemente em Malahide, na Irlanda, começou a explicar como se podem adiar as decisões por falta de informação. No entanto, entre entidades responsáveis, esta não é a forma de proceder. Com a pouca informação disponível têm de ser tomadas decisões, incluindo a decisão de não fazer, que “é uma opção legítima e que muitas vezes os planeadores esquecem”.
Num mundo pejado de decisões que, mais do que motivadas pelas necessidades e desejos das populações, estão muitas vezes alicerçadas na vontade de obter visibilidades fáceis ou protagonismos excessivos, cada vez mais o cidadão comum exige calma, contenção e moderação. Se até há pouco tempo a fatura das “obras de regime” parecia plausível, até por haver um deficit estrutural, hoje, a generalidade das pessoas já começa a exigir saber quem é que vai pagar o investimento e quem é que vai pagar a manutenção dos novos equipamentos. É bom que assim seja e os planeadores da nova geração terão que ter isso em consideração. Não basta imaginar que um determinado equipamento ficaria bem, é necessário saber quem vai pagar, quem vai usar e quem vai manter o funcionamento. Sem estas três questões claramente respondidas e de forma justa, penso que o refrear do investimento se impõe.
Há uns dias atrás, ouvi um pensador português a afirmar que tínhamos urgentemente de passar da lógica do “consumo” para a lógica da “suficiência”. Cada um, defendia ele, tem que se perguntar a si próprio o que lhe é suficiente e lutar por isso, mas refrear a ambição de ter o carro último modelo ou o gadget da moda. “O mundo não aguenta mais consumo!”.
Em Malahide, tentaram encontrar-se soluções para localizar no mar as novas unidades de produção energética que terão de substituir as centrais nucleares alemãs e francesas. Os planeadores estão atentos, têm soluções, mas estas têm que estar associadas a uma redução efetiva no consumo de eletricidade na Europa. Estaremos prontos para o fazer?
Para terminar realço dois outros papéis que poderão, no futuro, caber particularmente aos Açores no domínio da energia, são eles o sequestro de Carbono (por captura em algas ou afundamento no mar profundo) e a produção de hidrogénio em unidades off-shore. É uma realidade distante, quem sabe uma visão ou mesmo um delírio, mas é de pensamentos arrojados e libertos, associados a planeamento e trabalho, que se constroem sociedades mais justas e avançadas.

Cada um de nós terá o seu papel neste esforço conjunto. Temos de verificar onde estão os nossos excessos e conter. Temos de verificar em que podemos contribuir e esforçar-nos. Não está ao virar da esquina, mas vem aí um admirável mundo novo e, tal como aconteceu em relação à gestão de resíduos em 2006, sinto-me honrado por estar a participar em mais esta mudança de paradigma.

Sem comentários:

Enviar um comentário