quarta-feira, 27 de outubro de 2004

A Boa Onda

Naqueles dias em que tudo parece correr francamente mal, ponho-me a pensar com os meus botões: “o que poderá piorar este cenário?” Faço esse ensaio para verificar que “ainda podia ser pior” e que na realidade “tenho muita sorte em ter tido apenas sete azares consecutivos”. Claro que, invariavelmente, cai-me em cima mais um inesperado infortúnio.

Por diversas razões que não interessam para o caso, a semana das eleições regionais, incluindo as eleições regionais, não me correu de feição. Dificilmente poderia ter sido pior... Após o primeiro azar, dei por mim a pensar, “Não está mal de todo, repara que, por exemplo, o José Decq Mota ainda podia perder as eleições”. Não tinha ainda equacionado este terrível desígnio por completo quando o José Decq Mota não foi eleito! Ai, ai...

Enfim, só vos digo que as coisas continuaram numa sequência terrível, em que nada parecia correr bem. Até que... Fez-se luz! Em vez de equacionar pela negativa, resolvi rever todos os azares e interpretá-los pela positiva. Ou seja, por exemplo, o José Decq Mota não foi “não eleito”. Na realidade, ele ganhou um curto período de merecido descanso! Espero que tenha paciência para se candidatar à vereação da Câmara Municipal da Horta nas próximas eleições autárquicas. Eu preciso da sua voz crítica, incisiva, cooperativa e, principalmente, inteligente.

Na verdade, todos os factos podem ser vistos com uma perspectiva pessimista ou optimista, basta estar disponível. A interpretação é subjectiva e dependente de cada um. De tal forma isto é verdade que o facto de um cronista da cidade da Horta me ter comparado a uma “carpideira” pode ser depreciativo, ou não. Depreciativo porque eu, um homem honesto e viril (q.b.), ser comparado com uma mulher que é paga para chorar e gritar pelos mortos que não são os seus, não é muito prestigiante. Mas, por outro lado, posso pensar que foi um elogio porque significa que o tal cronista tinha apreciado a minha intervenção de tal forma que resolveu responder. Reagiu a algo que lhe parecia mal e traduziu-o por palavras escritas. Não posso dizer se ele tinha razão ou não, deixo isso à análise de cada um. Eu argumentei, ele argumentou e pronto.

Numa sociedade em que a razão e a opinião estão esquecidas, o facto de eu ter escrito algo suficientemente estimulante para outro responder já é motivador. Está alguém do outro lado. Alguém lê! É óptimo saber isso porque já julgava tudo perdido. Já via toda a gente agarrada ao telecomando, ou a lutar por ele, para poder ficar um pouco mais adormecido num zapping hipnótico. Mas afinal, não! Estou maravilhado.

Em relação ao tema de fundo, que tinha suscitado a intervenção e a resposta, tenho a dizer que não deve ser importante. Não que eu pense que não é importante, mas se não há mais gente a reagir ao findar do “Telégrafo”, enquanto nome de um diário faialense, é porque não deve ser importante. Numa ilha com apenas meio milhar de anos post colonização humana, uma das poucas instituições centenárias chega ao fim... Para mim é triste e, caso não se importem, irei “prantear” um pouco mais (o que é diferente de “carpir”), mas, como todos os outros azares de uma semana terrível, o desaparecimento do título “Telégrafo” deve ter um lado positivo. Eu é que ainda não descobri qual... Deixem-me acrescentar, em abono da verdade, que o “Incentivo” está, enquanto jornal, muito melhor que o “Telégrafo”. Escusavam era de lhe ter mudado o nome...

Aproveitando a onda de lamúrias, então aí vão mais umas: Não entendo porque autorizaram a abertura de uma loja de doces ali mesmo ao lado das Escolas Preparatória e Secundária da Horta? Será que os responsáveis não sabem que os doces fazem mal, especialmente, aos adolescentes? Também não consigo vislumbrar o lado positivo dos agentes da PSP de serviço a fumarem no Largo do Infante, durante o horário das aulas. Porque se dá tolerância de ponto a todos os funcionários regionais para irem ver um jogo de futebol? Já estou a ver as senhoras de meia idade a exigir tolerância de ponto para ver a telenovela da tarde!

Será que o problema é meu, por não estar disponível para compreender o lado positivo, ou será que estas coisas não têm mesmo “ponta por onde se lhe pegue”? Contra contingências inalteráveis da vida não vale a pena lutar, é melhor manter uma certa dose de “boa onda”, polvilhada de um pouco de humor e enfrentar a realidade com um sorriso nos lábios. Já em relação às inúmeras incongruências quotidianas, fruto do laxismo, incompetência, desonestidade ou irreflexão de quem é responsável, é nosso dever enquanto cidadãos chamar a atenção e, caso seja necessário, denunciá-las activamente.

terça-feira, 26 de outubro de 2004

Protegendo os Mares dos Açores

No dia 9 de Setembro esteve na Horta (Açores) o deputado europeu Sérgio Ribeiro. Durante esta visita, que se prolongou depois por Ponta Delgada, tentou obter dados para enriquecer e argumentos para fortalecer a proposta da Comissão Europeia sobre a protecção dos recifes de coral de profundidade dos Açores, ou seja em termos mais práticos, a proibição da pesca de arrasto de fundo nos mares dos Açores.

Durante esta visita o deputado europeu reuniu-se com responsáveis políticos, associações de pescadores e cientistas. A força partidária que elegeu o deputado Sérgio Ribeiro para o Parlamento Europeu, a Coligação Democrática Unitária, dinamizou um colóquio público para discutir o tema. Escusado será dizer que a ideia é boa! É bom partilhar com todos os interessados o problema em causa, apontar soluções e apelar para a obtenção de novos contributos. Pena é que os políticos se preocupem muito com o acessório e com o ego, perdendo tempo precioso a explicar ou a responder ao que não é necessário, e não ouvindo assim o essencial ou escapando ao mais importante. Numa época em que, cada vez mais, se pretende apelar à participação dos cidadãos, os políticos terão de aprender a fomentar o diálogo, pensando sempre que o seu papel é de informar, apelar construtivamente à participação, integrar os contributos e sumariá-los.

Voltemos à protecção dos mares dos Açores. A Comissão Europeia estava muito interessada em abrir os mares dos Açores às frotas da União. O argumento base é que se existe um recurso disponível no território da União ele deverá poder ser explorado por qualquer cidadão Europeu. Talvez para que não restassem dúvidas na aplicabilidade desta argumentação, a Comissão precipitou-se na abertura das águas dos mares dos Açores esquecendo-se das sensibilidades específicas desta área. Agora, diversos meses após a abertura, finalmente chega ao Parlamento Europeu o texto que defende um dos habitats dos mares dos Açores. “Mais vale tarde que nunca” é verdade, mas enfatizo que existem outras fragilidadesambientais conhecidas e que não estão acalentadas neste ou noutro documento. A maior fragilidade omissa neste documento é a escassez dos recursos. Ou seja, vão pescar o quê? Durante quanto tempo? Claro que a maioria dos países europeus não estão preocupados com isso. Têm os seus próprios problemas e pouco devem saber de Portugal, quanto mais dos mares dos Açores. Preocupa-me que a gestão dos recursos biológicos seja feita à distância e por entidades que ou não conhecem a realidade local ou estão demasiado interessados para poder dar um contributo isento.

Aliás, porque é que Franz Fischler nunca veio aos Açores? Porque não esteve em qualquer edição da Semana das Pescas? Não acredito que não tenha tido coragem, penso apenas que, de facto, estamos demasiado distantes, somos, para ele, pouco importantes. Segundo consta, o novo Comissário para as Pescas e Assuntos Marítimos será Joe Borg, de Malta. Era bom começar desde já a cativar a atenção deste Comissário para as especificidades das águas portuguesas.

Evidentemente que o ideal era que as regras que se aplicavam anteriormente, e que impediam as frotas internacionais de pescar nas nossas águas se mantivessem, mas, como não é possível, ao menos que se estipulassem atempadamente regras para evitar: 1- o esgotamento dos recursos, 2- destruição dos habitats e 3- introdução de novos problemas sociais. Que regras? Começar por fazer com que a gestão das águas dos Açores passasse também pelos próprios Açoreanos. Até poderia ter a Comissão Europeia a última palavra, por forma a precaver bairrismos injustificados, mas que a gestão começasse nos Açores com um painel de políticos (como representantes dos cidadãos), cientistas (para estabelecer a capacidade de carga do ambiente marinho), pescadores (incluindo armadores) e organizações não governamentais para o ambiente.

Na minha modesta opinião, dar a gestão às populações locais seria o primeiro passo para uma utilização cuidada do ambiente marinho. Caso desse certo, poder-se-ia aplicar este modelo a outras regiões da Europa, caso não funcionasse poder-se-ia voltar ao modelo actual. Como está, não irá funcionar. Não funcionou no Norte da Europa (onde se está a destruir a pesca de bacalhau) e não há razão para vir a funcionar nos Açores.

Passei os últimos dias a mergulhar em diversos locais dos Açores. Mais uma vez pude constatar a consequência lógica da falta de fiscalização, havendo pouca diferença entre as zonas exploradas e as áreas marinhas protegidas. Apesar disso, os Açores continuam a ser um marco no bom mergulho com escafandro autónomo de Portugal. Vi grandes animais, com boa visibilidade, fundos dinâmicos e a temperatura continua amena. Ainda vale a pena lutar pelo mar dos Açores!


Publicado na coluna "Casa-Alugada"

sábado, 16 de outubro de 2004

Pequeno manual para votantes indecisos

Para que fique claro, deixem-me que vos diga que sou apoiante da candidatura do José Decq Mota. Agora que já perceberam que têm de ler as linhas abaixo com o respectivo desconto, vou propôr um método em seis passos para ajudar os mais indecisos a optar.

Primeiro passo: Terá de ser pró-activo. Deverá deslocar-se às sedes de candidatura de cada uma das listas concorrentes e pedir um programa específico para a Ilha do Faial. Eu consegui obter cópias dos programas da CDU (obviamente), da Coligação Açores, do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda.

Segundo passo: Antes de começar a ler os programas deverá fazer uma listagem das coisas que considera importantes para si e para o Faial, visto que estamos a eleger os deputados que representarão a ilha do Faial. Feito isto, deverá procurar em que programas são correspondidas as suas pretensões. Para hierarquizar, deverá fazer um somatório das respostas positivas em cada um dos programas.

No meu caso escolhi as prioridades: 1) Ambiente, 2) Parque Marinho Faial-Pico, 3) Saneamento básico, 4) Departamento de Oceanografia e Pescas – estrutura, 5) DOP – pessoal, 6) Cultura – Hortaludus, 7) Saúde – Medicina hiperbárica, 8) Estradas, 9) Pescas. Claro que a candidatura que apoio é aquela que corresponde de forma mais adequada às prioridades que estabeleci. Mas é apenas o meu caso, cada um deverá estabelecer as prioridades que considerar adequadas. As candidaturas que responderem a todas as suas solicitações recebem 3 pontos, as que corresponderem a muitas das suas aspirações recebem 2 pontos, as que corresponderem a algumas das suas solicitações recebem 1 ponto, os que não corresponderem a nenhuma das suas aspirações recebem 0 pontos.

Terceiro passo: A outro nível, deverá analisar as prestações dos candidatos que são neste momento deputados. Hierarquize as prestações dos últimos quatro anos como positivas ou negativas. As candidaturas cujos os deputados tiveram uma prestação positiva recebem um ponto, os que tiveram uma prestação negativa recebem zero pontos, As candidaturas que nunca tiveram deputados merecem o benefício da dúvida e, portanto, levam 1 ponto.

Quarto passo: Filosofia. Aqui é que a coisa é mais complicada. Tenho a dizer que candidatura que apoio não ganhou este ponto. De facto deverá atribuir 1 ponto às candidaturas cuja filosofia e prática inerente aos partidos em causa corresponda às suas preferências ideológicas. Em eleições nacionais este passo teria muita importância, mas a nível regional recebem 1 ponto as candidaturas que corresponderem às suas convicções políticas-partidárias e 0 as restantes.

Quinto passo: Aqui deverá avaliar o mérito de campanha das candidaturas. Avaliará o empenho, a solicitude e a honestidade transparente. Pense nos candidatos que correspondem a cada uma das listas e tente lembrar-se onde os viu e a fazer o quê? Tentaram esclarecê-lo? Falaram bem? Recebem um ponto os que lhe pareceram bem e zero pontos os que lhe pareceram mal.

Sexto passo: Some todas estas quatro parcelas e veja qual poderia ser o seu voto. Claro que a seguir utilize o seu discernimento, que é muito melhor que a minha metodologia, e opte pelo que a sua consciência lhe indicar. O importante é mesmo votar. Bom voto!

O Telégrafo Morreu

Achei que era importante registar que “Telégrafo” acabou. Isto sabe-me a heresia, mas é verdade. Foi impressa a última edição do jornal “Telégrafo”. Cento e doze anos depois da primeira edição, o “Telégrafo” acabou. Se houver mais pessoas incomodadas, como eu, que se manifestem. Talvez os irmãos Gonçalves reconsiderem e tragam o velhinho “O Telégrafo” de volta (com ou sem “O”). Apenas para reforçar esta ideia deixem-me que vos diga que, na minha mui modesta opinião, das poucas coisas que estavam certas naquele matutino da cidade da Horta era precisamente o nome. O Telégrafo morreu, viva o Telégrafo!