Convém termos presente que a situação ambiental nos Açores é muito melhor que na maioria do Planeta Terra. Há locais em que a guerra, a fome, a miséria, a falta de educação e outros factores colocam a natureza sob pressão. É impossível dizer a quem tem frio que não pode cortar o último arbusto e é muito complicado tentar transmitir a importância e o determinismo das alterações climáticas a quem não sabe ler. Ou seja, apenas num contexto de privilégio cultural, social e económico é possível chamar a atenção sobre os problemas ambientais, por mais catastróficos que sejam. E são.
Por sorte, nos Açores o clima social é o adequado para pensarmos e debelarmos a maioria dos problemas ambientais de que padecemos e para pensarmos como podemos contribuir para a manutenção e melhoria da nossa qualidade ambiental. Para o fazer, o melhor é começar por identificar os problemas. Em vários relatórios e outros documentos há algumas mazelas que são referidas recorrentemente. Entre elas: a inadequada gestão da água e a dos resíduos, a perda da floresta natural e o decrescimento dos recursos marinhos vivos renováveis.
Em relação aos recursos marinhos, de facto, estamos tão preocupados que iniciámos e mantemos um contencioso europeu sobre esta matéria. É uma luta que está a ser travada ao mais alto nível e ao cidadão em geral cabe a tarefa de pressionar para que a normalidade volte ao sector das pescas açorianas. Não é possível manter-se a abertura generalizada das águas em volta da ZEE dos Açores. É má gestão e a responsabilidade, até por ter reiteradamente avisado, não é da Região Autónoma.
No que se refere à gestão dos resíduos, apesar de alguns esforços mais ou menos concertados, o certo é que continuam a imperar soluções que não garantem a valorização da maior parte deles ou a salubridade do depositado. Recentemente, após muito tempo de trabalho conjunto, intenso e alargado, o Governo publicou legislação que articula as soluções para as diferentes ilhas e atribui responsabilidades. Assim, o Governo dos Açores decidiu instalar as soluções para as chamadas “ilhas da Coesão”. Nos próximos anos serão construídos diversos centros de processamento, transferência e valorização orgânica por compostagem. Os dois primeiros grupos de centros servem para triar e remeter para destino final adequado cerca de 1/3 dos resíduos. Um terceiro grupo serve para transformar a matéria orgânica em composto. Este composto poderá servir como aditivo para os solos. Pensa-se conseguir, desta forma, tratar a maioria dos resíduos. O restante deverá ser depositado em aterro ou valorizado energeticamente. Isso poderá acontecer endogenamente, em cada ilha, ou numa ilha em que esteja disponível uma destas soluções. Em paralelo, é imprescindível que o cidadão dos Açores mude o seu comportamento em relação aos resíduos. Teremos, obrigatoriamente, de fazer um esforço na redução dos resíduos produzidos, com inteligência reutilizar o que for possível e participar nas iniciativas da autarquia para separar o lixo logo à partida.
Quanto à gestão da água nos Açores, o maior problema reside provavelmente numa má estratégia estabelecida no passado. Arrotear as terras de floresta de altitude, especialmente as ocupadas com turfeiras, pode ter sido um erro que agora estamos a pagar. É que esta flora tem a importante capacidade de absorver água no período de chuvas e disponibilizá-la, lentamente, no período de seca. Evidentemente, estamos perante uma infeliz conjunção de factores que, ao referido arroteamento, junta níveis mínimos de precipitação e um aumento na qualidade de vida e, em consequência, do consumo. Portanto, a curto prazo será necessário que cada um de nós utilize a água com a parcimónia possível e que se recuperem largas manchas de flora natural. Aliás, se tivermos em atenção que, entre as mais de mil espécies de flora existentes nos Açores, apenas 30% cá estavam no momento da colonização (as restantes foram trazidas pelos humanos), temos uma razoável indicação da pressão a que estão sujeitas as plantas dos Açores. Para além da difícil gestão da água, há outros serviços ambientais que estão em perigo e que beneficiarão com a promoção da flora natural dos Açores, como a retenção de solos, a protecção de arribas e a manutenção de espécies superiores (garantindo as cadeias tróficas).
O Arquipélago dos Açores é um oásis em termos ambientais. Não temos grandes problemas de poluição, é possível que as alterações climáticas não venham a ter um grande impacto directo e os recursos estão razoavelmente preservados. No entanto, as nossas mais-valias são a plena consciência dos problemas que temos e possuirmos recursos humanos, tecnológicos e financeiros para os resolver. Caberá a cada um de nós, dentro das nossas possibilidades, contribuir para um mundo em sintonia com a nossa capacidade de carga ambiental.
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