Nas vésperas do novo ano aqui fica a minha sugestão de ano novo: Visite Istambul!
Seguindo o meu conselho, suponha o leitor que é um potencial turista que irá visitar a Turquia em breve. Portanto, sorte sua, irá, a partir deste momento, beneficiar dos conhecimentos de um experiente ex-turista que esteve em Istambul durante seis dias! Quando eu parti, não tinha lido esta crónica e, por isso, tive enormes dificuldades. E passo já a justificar o exposto com um ensinamento Oriental que aprendi no "Museu de História da Ciência e da Tecnologia do Islão " de Istambul. Segundo as sábias palavras de Ibn Magid (proeminente navegador dos séculos XV e XVI), existem três tipos de profissionais: os que aplicam sem cogitar (marinheiros), os que pensam e melhoram a sua profissão (mestres) e os que partilham o que aprenderam. Apenas estes últimos ascendem à excelência do seu metier. Portanto, aqui estou eu, turista reformado de Istambul, a partilhar a minha nova sapiência. Primeiro ensinamento. Escusa de trocar dinheiro em Portugal. As flutuações do mercado financeiro, as conversões mais favoráveis e os muitos gabinetes de câmbio aconselham a trocar dinheiro in loco. Atenção, não troque nos bancos porque a conversão é menos favorável e, como em Portugal, têm um horário mais reduzido. Ensinamento sobre transportes. Viaje nos transportes públicos. Eu optei pelo chamado JetOn e por andar a pé. É uma óptima e saudável combinação. Não compre o bilhete (uma pequena moeda que se insere à entrada de uns torniquetes) a qualquer funcionário que esteja por ali perdido. Quando o fiz, fui enganado em 30%. Compre nos guichets que se encontram, habitualmente, a 20 metros dos torniquetes. Ensinamentos sobre comércio. Não sorria, você vai ser enganado nas compras que fizer. Mesmo assim, aqui vão algumas indicações. Nunca pergunte o preço. Perguntar o preço é um sinal de fraqueza. Das três uma: o preço está assinalado (o que não significa que não seja negociável, mas, normalmente, corresponde a um bom preço); você sugere o preço demonstrando um enorme saber e uma enorme confiança ou, se perguntar, será enganado. Em Istambul há mais de uma dezena de sinagogas, mais de uma centena de igrejas e milhares de mesquitas. Parece um número elevado, não é? No entanto, por cada um destes monumentos, eu vi dezenas de lojas. Aqui há uma tradição de enganar o próximo (leia-se, negociar) com centenas de anos. Não será você que irá fazer quebrar esta tradição. Se lhe venderem um produto é porque está a perder dinheiro. Um vendedor em Istambul, se estiver a perder dinheiro, não vende. Não há amizade ou galanteio. Dou três exemplos:
1) Reparei, quando entrava no Palácio Topkapi, que vendiam duas garrafas de água por meio euro (vou referir-me a euros para situar, embora o comércio seja feito habitualmente em liras turcas). Quando saí, encontrei um vendedor que pedia meio euro por garrafa. Mostrei-me irredutível e disse-lhe que apenas pagaria um quarto de euro. Ele mandou-me passear com um belo "então, não bebe! ". Apenas 50 metros à frente, lá estava um vendedor com o preço certo. Ou seja, apenas porque não estaria a enganar-me o suficiente, o primeiro vendedor não vendeu a água. 2) Perto da enorme basílica de Santa Sofia, agora um museu depois de ter sido uma mesquita, estava um vendedor daqueles tradicionais chapéus árabes. Por sugestão, resolvi utilizar a aproximação marroquina e ofereci metade do preço, disposto a subir 20%. O vendedor olhou para mim como se eu o estivesse a ofender - "eu seria lá capaz de o enganar ". Como planeado, ofereci um pouco mais de metade e dispus-me a comprar três chapéus. Grande negócio, pensei eu... Tinha acabado de comprar três chapéus por 17 euros e meio. Uma bagatela! Mais tarde visitei a Meca do comércio em Istambul, o Grande Bazar. Aí, pude ver os meus três chapéus por 3 euros... 3) Com as experiências anteriores, eu não poderia ser mais enganado. Agora sabia tudo sobre o comércio na Turquia. Um autêntico profissional da sociologia local. Engano. Enganado! À porta da Mesquita de Süleymaniye resolvi comprar postais. Estava na altura de escrever à família e tinha que "queimar tempo " porque estava no período das orações (em que os turistas não devem entrar nas mesquitas). Fui até à loja mais próxima e siderei-me por um lindo postal vermelho com a simbologia turca. Como estava um pouco carcomido do Sol achei que obteria um bom preço. Perguntei, o dono respondeu-me, "meio euro ". Tinha de memória que um postal em boas condições, aqui, custaria cerca de 5 cêntimos e,por isso, senti-me verdadeiramente enganado. Com um misto de repulsa pelo vendedor e orgulho por ter escapado, coloquei o postal no lugar e fui à minha vida. Ele ainda gritou "quantos quer? ", mas era tarde. Fui-me! Já ao anoitecer passei numa loja que anunciava "10 postais por meio euro! " Eh, eh... Aqui estava. Dirigi-me ao escaparate, escolhi e paguei. No final, a um turista que tinha acabado de chegar, ainda disse "os postais mais baratos da Turquia ". Que tolo eu sou... Nem 10 passos à frente estava outra loja que anunciava "12 postais por meio euro! "... Mesmo que não compre, ficará sempre frustrado. Porque é que ficará frustrado sem comprar? Porque, há realmente produtos muito baratos e, se não comprar qualquer coisa, ficará com a sensação de que perdeu uma excelente oportunidade. Em súmula das questões de compras, veja primeiro, tome notas e vá para fora dos centros turísticos. Vá até aos locais em que os turcos compram. Eu fiz isso e pareceu-me que eram preços mais concorrenciais, não me sentindo mais inseguro por estar fora das zonas turísticas. Ensinamentos sobre passeios. Ao final da tarde vá até à beira do Bósforo. O vento térmico é mesmo agradável e refrescante. Se estiver na zona dos barcos verá uma das maiores confusões, com milhares de seres humanos a cruzarem-se a velocidades incríveis para terem a certeza que não falham o último barco. Todos são o último, pelo que vi. Por falar em Bósforo. Dê um passeio de barco pelo Bósforo. Às 15 horas, à entrada do Museu de Santa Sofia irão prometer-lhe um passeio de barco por 15 liras. Na realidade, depois de estar dentro do barco, o preço transforma-se em 15 euros, mas vale a pena. Para além dos Guias serem de uma enorme gentiliza e simpatia, dominam inglês, francês, espanhol e italiano. Fiquei impressionado com a sua fluência e conhecimentos. Para além disso, uma paragem de 30 minutos no outro lado dá um pequeno sabor a Ásia que fica bem a qualquer viajante que se preze. Tenha também em atenção que à ida para o barco irão levá-lo de minibus, mas à volta estará por sua conta. Aproveite para ver o Bazar das Especiarias que fica ali perto. É imperdível. O Expresso do Oriente, que terminava em Istambul, foi esquecido. Hoje em dia há apenas umas fotos numa parede de um restaurante e dum hotel homónimos. No entanto, não consegui encontrar um belo museu que replicasse o luxo, o bom gosto e as aventuras desse marco dos séculos XIX-XX. Talvez tenha sido a minha maior desilusão nesta viagem. Considerações finais. Este país, sucessor da influência grega e dos Impérios Romano, Bizantino e Otomano é um colosso que não está a dormir. A Turquia representa uma das 20 maiores economias mundiais e é também uma potência regional localizada num local estratégico na ligação entre o Norte e o Sul e entre o Ocidente e o Oriente, com uma cultura original e bem preservada. O seu exército é o segundo maior da NATO com mais de 1 milhão de homens. Para este país, fundamentalmente modernizado em 1923, antevejo grandes passos em direcção a uma democracia plena (neste momento apenas os partidos com mais de 10% dos votos podem estar representados no Parlamento). Esta é uma terra orgulhosa dos seus. A título de exemplo refiro que os vencedores dos simples jogos escolares locais têm a fotografia exposta no liceu em cartazes com vários andares de altura. A cidade de Istambul tem mais de 8 mil anos de História para contar. As maiores civilizações europeias passaram por aqui e isso reflecte-se numa cultura diversa e disponível a quem quiser visitar. O visitante, apesar de permanentemente assediado por vendedores, sente-se bem recebido.
Existem diversas formas de aferir o nível de uma civilização. Entre elas, a forma como tratam as crianças e os animais. O número de vezes que o meu filho David foi acarinhado, sem qualquer razão especial, apenas é comparável ao número de gatos. Estes omnipresentes animais são alimentados por toda a gente, especialmente pelos varredores de rua que assim se livram dos restos de comida. Não se admire se, por baixo de uma mesa de restaurante, aparecer um gato a roçar-lhe nas pernas. É que esta é uma cidade de gente de bem.
Bons conselhos! Obrigado.
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