sexta-feira, 8 de abril de 2011

Espécies Endémicas

Symphodus caeruleus uma espécie endémica dos Açores.
Foto: F Cardigos - ImagDOP


Uma espécie endémica é, por definição científica, aquela cuja distribuição natural está limitada a uma área conhecida. Portanto, quando nos referimos a uma espécie endémica, temos de mencionar sempre a área a que diz respeito até porque, tanto quanto sabemos e apesar de algumas notícias bombásticas oriundas da NASA, todos os organismos são endémicos do planeta Terra.
E porque é que é importante falar de organismos endémicos? Por duas razões. Primeiro, por uma questão de responsabilidade. Nas áreas a que se limitar a distribuição natural de um organismo deve ser dada particular atenção à sua conservação. Por exemplo, a China deverá ter particular empenho na conservação dos pandas, já que a sua distribuição natural se limita àquele país.
A segunda razão prende-se com uma questão de oportunidade. É que a probabilidade de observar um determinado organismo é muito mais elevada na sua área de distribuição natural. Por outro lado, há muitos puristas que apenas valorizam a observação das espécies nos seus habitats naturais, recusando a descontextualização provocada pelos oceanários e jardins zoológicos ou botânicos. É, portanto, uma oportunidade de engrossar as possibilidades do chamado “turismo de natureza”.
No caso dos Açores temos muitas espécies endémicas. Neste artigo irei referir algumas que, por considerar emblemáticas ou curiosas, me merecem particular destaque.
Se houvesse justiça, o verdadeiro símbolo vivo dos Açores deveria ser a vidália, de nome científico Azorina vidalii. É o único organismo dos Açores que, para além da espécie, é endémico ao nível do género. Para quem não esteja familiarizado com esta forma de classificação, digamos que no mundo inteiro não há nada, sequer, parecido! É mesmo nosso, muito mais açoriano que qualquer açoriano. Para além disso, a vidália dá um conjunto de flores lindíssimas.
A verónica, Veronica dabneyi, esteve perdida durante dezenas de anos. Já julgavam os cientistas que estava irremediavelmente desaparecida até que o Dr. José Pereira, técnico da Direcção Regional do Ambiente, a encontrou numa pequena ribanceira da Ilha das Flores. Depois disso, o vigilante da natureza Hélder Fraga encontrou uma segunda população no Corvo. Portanto, até que alguém tenha notícias diferentes, esta delicada flor é endémica do Grupo Ocidental dos Açores.
Há um escaravelho que, no mundo inteiro, apenas habita as rochas do Vulcão dos Capelinhos (Ilha do Faial). Trata-se do Gietella faialensis e é um dos misteriosos casos de especiação que ocorre no nosso arquipélago. Se vos parece estranho existir um animal que apenas vive numa área do tamanho dos Capelinhos, imaginem um outro insecto que apenas existe nalgumas grutas dos Açores…
Há mesmo animais mais complexos com a sua distribuição limitada aos Açores. Falemos de duas espécies de peixes. O primeiro caso, o rascasso-dos-Açores, Scorpaena azorica, infelizmente, já não é, na realidade, endémico dos Açores, dado ter sido registado fora do arquipélago. Aliás, é engraçado, foi apanhado nos Açores e descrito pelas missões do início do século XX do Príncipe Alberto I do Mónaco e, estranhamente, nunca mais foi capturado outro animal. Há uma dezena de anos foi apanhado o segundo, mas… no Mediterrâneo. E assim se perde uma espécie endémica…
O segundo peixe endémico, e este continua a sê-lo, é o bodião-verde, Symphodus caeruleus. Este peixe foi identificado e descrito em 1999 pelo Professor José Azevedo do Departamento de Biologia da Universidade dos Açores. Até então, era confundido com outro peixe muito parecido e com uma distribuição mais vasta.
A ave marinha painho-de-Monteiro, de nome científico Oceanodroma monteiroi, apenas nidifica nos ilhéus da Graciosa e foi descoberta de uma forma particularmente interessante. O Doutor Luís Monteiro, do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores, descobriu-o porque estranhou a forma de ele cantar… Daí até ser descrito e aceite pela comunidade científica, demorou alguns anos, mas o passo inicial foi uma ligeiramente diferente forma de cantar…
No entanto, talvez o endemismo mais conhecido nos Açores seja o Priolo, Pyrrhula murina. Este pequeno pássaro tem a sua distribuição natural limitada à Serra da Tronqueira e seus arredores nos concelhos do Nordeste e da Povoação na Ilha de São Miguel. Já é alvo de roteiros turísticos exclusivos!
Para mim, pessoalmente, o endemismo que mais urgentemente precisava de mais informação é o morcego-dos-Açores, Nyctalus azoreum. Este era o único mamífero presente nos Açores aquando do povoamento humano e é dos únicos morcegos diurnos do mundo. No entanto, a escassez de dados sobre as diferentes populações e suas variações anuais apontam para a necessidade de caracterização detalhada.
No total, de acordo com a recente listagem feita em pleno Ano Internacional da Biodiversidade pelo Professor Paulo Borges e colegas, nos Açores há mais de quatro centenas de espécies endémicas. São meio milhar de possibilidades de turismo direccionado e exigente que está disposto a pagar bom dinheiro para ver estas espécies nas ilhas de Bruma. Saibamos aproveitar!

2 comentários:

  1. Correcção do Género por observação correctíssima do Ricardo Cordeiro. De Centrolabrus passa a Symphodus. Obrigado, Ricardo.

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  2. Obrigado por responder minha duvida ! (:

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