"Naissance d'une Nation" de Marius Vos.
Foto: F Cardigos
Ao contrário do que este título poderá indiciar, e apesar de
ser um firme defensor da autodeterminação dos povos, eu sou muito crítico
quanto à formação de novos países. Penso que a cultura, a dimensão, a
coerência, a solidariedade e a redundância da maioria dos países actualmente
existentes deve ser mantida e apenas colocada em causa perante situações
extremas.
Ainda em jeito de introdução, devo deixar claro que não
estou a escrever sobre a Catalunha ou a Escócia, mas sim sobre Estados
soberanos. Portanto, não vou escrever sobre o eventual futuro, mas sim sobre o passado.
Para olhar para esse passado, vou-me deter em três exemplos: Timor-Leste,
Eslováquia e Estónia.
Como as pessoas da minha geração e mais idosas se lembram,
no início do século, após dezenas de anos de repressão Indonésia, Timor-Leste
conseguiu a sua independência. Várias pessoas protagonizaram a resistência timorense,
tornando-se heróis internacionais. Portugal, neste período, na minha opinião,
escreveu algumas das suas páginas de ouro em termos de abnegada solidariedade e
virtude diplomática.
A Eslováquia nasceu, enquanto país soberano, por cisão da
Checoslováquia em 1993. Muito simplesmente, as autoridades do Sul demonstraram
interesse em ser independentes e o Norte aceitou. A norte ficou a República
Checa e a Sul a Eslováquia. Não houve dramas nem confrontos. O então Presidente
da Checoslováquia não apelou a nacionalismos, nem movimentou as tropas. Tudo
foi feito com rapidez e elevação.
Por último, quero deter-me no caso mais antigo deste trio. A
Estónia cobre um território habitado desde há mais de oito mil anos. Durante
centenas de anos, o seu espaço fez parte de países como a Alemanha, a
Dinamarca, a Suécia e, finalmente, o Império Russo. No século XIX , por
iniciativa de intelectuais deste território, fizeram-se esforços para valorizar
a cultura estónia passando também por uma divulgação e normalização da própria
língua. Com o segundo maior nível de literacia do Império, a população da
Estónia estava preparada para o processo que hoje é denominado por “acordar
nacional”. Localmente, uma das formas utilizadas para valorizar a cultura foi a
realização de encontros de coros musicais. No século XIX esta seria uma maneira
eficiente de transmitir a língua de uma forma apelativa, harmónica, inclusiva e
festiva. Desde 1869 que o Festival de Coros da Estónia anima a cidade de
Tallinn a cada cinco anos. Em 2014, perante 80 mil pessoas, actuaram mais de
trinta mil cantores divididos em mais de 1000 coros. São números impressionantes
e que, sem dúvida, movimentam uma pequena nação.
Entre os passos mais importantes do “acordar nacional” no
século XIX conta-se o progressivo estabelecimento de instituições estónias o que,
aproveitando a Revolução Russa de Outubro de 1917, permitiu que no início de
1918 a Estónia já se autoproclamasse como país independente. As instabilidades
europeias dos anos 30 e 40 atiraram a Estónia para um período de quase nula
autonomia, quanto mais independência… Em 1991, com a queda do Muro de Berlim, a
Estónia voltou a ser um Estado soberano e, já agora, assente numa democracia sólida.
Por razões completamente diferentes e com percursos
contrastados, Timor-Leste, Eslováquia e Estónia tornaram-se recentemente inquestionáveis
Estados soberanos. As suas jovens democracias, ainda com algumas vicissitudes,
são prometedoras de países estáveis e justos. Penso que são exemplos dignos de
como se faz um país.
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