sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

Crónicas de Bruxelas - 85: A experiência Eslovaca

Paisagem eslovaca.
Foto: F Cardigos

Apesar de noticiada, passou relativamente desapercebida a recente experiência eslovaca para travar o progresso da pandemia de covid-19. Este país decidiu testar grande parte da população de cerca de cinco milhões de habitantes em dois dias, com uma semana de intervalo. Na sequência dos testes, as cerca de 50 mil pessoas que acusaram positivo foram isoladas travando efetivamente o progresso da pandemia. Os que optaram por não fazer o teste, terão de permanecer os 10 dias seguintes em casa.

Obviamente, este não é um procedimento com 100% de eficácia. Todas as pessoas que já estão infetadas e cuja incubação ainda não atingiu o nível mínimo de deteção terão resultado negativo e, na realidade, são portadoras. Adicionalmente, as pessoas que entrarem no país depois dos dois períodos de testes e forem portadoras do vírus poderão transmitir a doença. No entanto, apesar destas limitações, este é um procedimento com resultados expectáveis que atenuarão o efeito da segunda vaga, permitirão seguir e debelar cadeias ativas e será suficiente para evitar o confinamento que vivemos nos restantes países europeus. Com este passo, a Eslováquia irá manter o país plenamente ativo. 

Evidentemente, o esforço para realizar estes dois períodos de testes obrigou a colocar no terreno uma enorme estrutura que incluiu, para se ter uma ideia da dimensão, cinco mil centros de teste. Foi necessária uma mobilização sem precedentes que incluiu pessoal médico, voluntários e até as forças armadas. O esforço foi elevado e oneroso. Segundo li na comunicação social, o orçamento previsto era de 75 milhões de euros. Mas será, na realidade, um valor elevado? 

É muito dinheiro, certamente. No entanto, fazendo uma contas muito por alto, tentei compreender quanto custa um confinamento. Não é fácil… Para além das questões financeiras diretas e económicas de longo prazo, há uma indubitável e não calculável pegada social. 

O impacto nas pessoas que não têm acesso a cuidados de saúde normais por causa do confinamento e do esgotar das capacidades hospitalares, o desemprego e o impacto psicológico resultante da limitação de contactos pessoais é, indiscutivelmente, elevado e não mensurável. 

Em termos puramente financeiros não se sabe bem qual é o impacto, mas há alguns dados. Por exemplo, a EDP reduziu o negócio em Portugal e no Brasil na ordem dos cem milhões de euros com a primeira vaga. A Alemanha deduziu que o impacto das novas restrições provocadas pelo segundo confinamento deve ascender a 19 mil milhões de euros. Fazendo umas rápidas contas de merceeiro com base na proporcionalidade à população e tendo como ponto de partida os cálculos para a Alemanha, podemos concluir com uma razoável margem de erro que um segundo confinamento na Eslováquia teria um impacto financeiro na ordem dos mil milhões de euros. Como nos limitamos à componente financeira, obtemos um valor calculado por baixo. Ou seja, no mínimo e retirado o investimento mencionado atrás, o saldo positivo da experiência eslovaca, caso resulte, é de 925 milhões de euros. 

São 925 milhões de euros a que se somam a saúde, os empregos e a sanidade psicológica de muitos. Vale a pena arriscar? Sim, sem pestanejar. 


Notas:

https://pt.euronews.com/2020/11/01/eslovaquia-faz-testes-rapidos-a-toda-a-populacao

https://www.bbc.com/portuguese/geral-53204453

https://observador.pt/2020/09/04/covid-19-teve-impacto-direto-nas-contas-edp-superior-a-100-milhoes-a-maioria-no-brasil/

https://expresso.pt/economia/2020-11-01-Covid-19-Novas-restricoes-na-Alemanha-terao-custos-de-19-mil-milhoes-de-euros

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