Ao acordar fui ver as notícias da manhã no telemóvel, uma
prática que tenho há muitos anos e que não recomendo de todo. Os acordares
devem ser suaves e com um bom pequeno almoço, não com uma indigestão de más
notícias. No meu caso, o trabalho a isso obriga.
Olhando para o vil e cruel dispositivo de comunicação, deparo-me
com uma mensagem alertando para a necessidade de efetuar uma atualização do software
associado à segurança do Wi-Fi. Um cérebro mal dormido faz perguntas tolas e,
neste caso, não foi exceção… “Que raio quer dizer “Wi-Fi”?”. Pesquisei
e, em três tempos, tinha a anódina resposta: “wireless fidelity”. Não
fiquei mais feliz com a resposta.
No entanto… e a verdadeira aventura do conhecimento começou
aqui… havia um apontador que dizia “os torpedos auxiliam a invenção do Wi-Fi”. “Torpedos,
submarinos, submarinos, mar, mar é a minha profissão… Se calhar, devia aprender
mais sobre isto… Como é que os torpedos se relacionam com um dos protocolos de
comunicações mais usado? Queres ver que o mar está por trás disto?” O meu
cérebro lutava para acordar e para fazer algum sentido de tudo aquilo.
Comecei pelo inesperado início: Hedy Lamarr era uma senhora austríaca,
judia, convertida ao catolicismo por insistência do primeiro marido. Atriz
antes do casamento, o marido proibiu-a de continuar a representar. Depois de fugir
de forma engenhosa de um casamento que a privava da sua liberdade na sua terra
natal, tornar-se-á uma atriz de nível planetário em Hollywood.
Mas Hedy Lamarr não era apenas uma actriz de renome. Desde a
mais tenra idade que se interessava por “engenhocas”. Mais tarde, ao mesmo
tempo que triunfava nas telas, alimentou o seu espírito inventivo com soluções
que se revelariam de extrema utilidade muitos anos mais tarde.
No início da Segunda Guerra Mundial, em conjunto com o seu
pianista, George Antheil, procurava formas de comunicação que evitassem a
destruição dos torpedos radio-comandados usados pelos Aliados. Hedy tinha
adquirido um certo conhecimento sobre diferentes tecnologias utilizadas em
armamento na altura do seu primeiro casamento, sendo o seu primeiro marido um
fabricante de armas. Da tempestade de ideias acabou por nascer o conceito de
"sinais em frequência aleatória" (frequency-hoping
spread spectrum) , que tornaria mais difícil intercetar ou mesmo adulterar
as comunicações. A Marinha de Guerra dos Estados Unidos, a quem propuseram o
conceito, não compreendendo o potencial daquela ideia e considerando-a irrealizável, pô-la precocemente de lado. Muitos anos mais
tarde, o conceito de "sinais em frequência aleatória" foi repescado e
hoje serve de base à segurança dos protocolos de comunicação usados no Wi-Fi,
GPS e Bluetooth.
Os seus anos finais
não foram felizes. Entre os processos judiciais em que se envolveu, o
isolamento e a incompreensão, Hedy Lamarr acabou, de forma voluntária, fisicamente
distante de todos. Como é fácil de compreender, consequência do seu legado, a
sua história não acabou com a sua morte no ano 2000 e o reconhecimento tardio
veio na forma de um prémio - o Pioneer Award of
the Electronic Frontier Foundation.
Ao contrário do que pensei, a minha história não parou no
mar. Acabou realmente distante. Parou no céu. Hedy Lamarr é hoje o nome de uma
estrela no nosso céu. Uma estrela que saiu das telas e saltou para o universo…
Rendi-me. Adormeci de novo e sonhei com estrelas construídas
com base no melhor engenho humano.
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