sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Voo do Cagarro - 9: Observando aves

Um dos observatórios do EVOA
Por Frederico Cardigos
 

Desafiado por um amigo que percebe realmente da temática, fui ver aves para o Estuário do Tejo neste último domingo. Segundo ele (eu não saberia identificar), observámos quase quatro dezenas de espécies de aves. Para além das aves, também vimos muitas espécies de plantas, claro, diversos artrópodes (incluindo insetos) e um réptil. Foi um final de tarde muito instrutivo.

O sítio que explorámos está entre a paisagem agrícola, a lezíria, e um conjunto de lagos, curiosamente construídos pela mão humana para servir de abrigo às aves e ponto de observação. Esta interface entre os dois mundos resulta em pleno e, para melhor a rentabilizar, foi construído um centro de interpretação, denominado EVOA (acrónimo de “Espaço de Visitação e Observação de Aves”), e diversas vias de exploração pedestre.

Para chegar ao EVOA é necessário percorrer uma dezena de quilómetros em estrada de terra batida. Ou seja, está isolado das perturbações sonoras mais evidentes, como a indústria ou os automóveis. Aqui podemos ouvir a natureza. No centro, para além de pagar a entrada, podemos adquirir guias e a parafernália típica dos ornitólogos (guias, binóculos, etc.) ou simplesmente consumir uma bebida no bar.

Os percursos que partem do EVOA prolongam-se por diversos quilómetros e, nos locais mais adequados para a observação de aves, existem observatórios. Para meu desgosto, que adoro a noite, o centro encerra às 19 horas, o que impede de ver e ouvir a fauna noturna. Talvez este seja o único ponto negativo do EVOA.

Nos Açores há diversos locais esplêndidos para a observação de aves e muitos deles já estão também equipados com observatórios. Na ilha do Corvo há mesmo um centro de interpretação dedicado à ornitologia e um centro de recuperação de aves selvagens.

Apesar de ser impossível ver dezenas de espécies de aves num dia, nos Açores há um conjunto muito particular e que agrupo da seguinte forma: as endémicas, as aves marinhas e as aves de arribação norte-americanas. As endémicas incluem o priolo de São Miguel, a estrelinha de Santa Maria e o priolo-de-Monteiro da Graciosa. Quem quiser observar estas aves ao vivo no seu habitat natural terá de se deslocar a estas ilhas. No mundo inteiro, não há outra hipótese.

Nas nossas ilhas há diversas espécies de aves marinhas. Algumas usam o nosso território para nidificar e, por isso, podem aqui ser facilmente observadas nessa época. Para além do cagarro, as diversas espécies de garajaus merecem particular referência. Podem ser observadas noutros locais, mas a concentração e o comportamento que exibem nos Açores têm paralelo em poucos locais.

Por último, as aves de arribação norte-americanas. Estas não existem na Europa e apenas chegam aos Açores nos dias de tempestade. São involuntariamente transportadas da América do Norte até ao nosso território e, para os ornitólogos, constituem uma rara e valiosa hipótese de ver espécies americanas em solo Europeu. Por ano, há umas dezenas de observações com estas características. Durante o inverno, ultimamente, estes turistas têm ocupado quase em pleno as unidades hoteleiras das Flores e Corvo.

Para os que, como eu, gostam de aves e da sua diversidade, mas não são apaixonados, podem ser razoavelmente indiferentes as observações que fazemos. Tenho uns quantos guias de aves nos quais vou assinalando as observações mais relevantes. Nada mais do que isso. No entanto, para os ornitólogos que hierarquizam o sucesso individual de acordo com o número de espécies diferentes observadas, é fundamental aceder aos locais onde podem acrescentar valor ao seu handicap. Para comparação, um clube de futebol com sucesso tem cerca de 100 mil sócios pagantes e o maior clube dos ornitólogos britânico, de nome Royal Society for the Protection of Birds, tem um 1,1 milhões. É muita gente…

Há aqui um nicho muito interessante e que os açorianos têm sabido cativar ao longo dos últimos anos. Mesmo para os não ornitólogos, garanto que passar um final de tarde em comunhão com a natureza e com a amigos a ver aves é um período muito bem passado!

 

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