Desafiado por um amigo que
percebe realmente da temática, fui ver aves para o Estuário do Tejo neste
último domingo. Segundo ele (eu não saberia identificar), observámos quase
quatro dezenas de espécies de aves. Para além das aves, também vimos muitas
espécies de plantas, claro, diversos artrópodes (incluindo insetos) e um
réptil. Foi um final de tarde muito instrutivo.
O sítio que explorámos está entre
a paisagem agrícola, a lezíria, e um conjunto de lagos, curiosamente
construídos pela mão humana para servir de abrigo às aves e ponto de
observação. Esta interface entre os dois mundos resulta em pleno e, para melhor
a rentabilizar, foi construído um centro de interpretação, denominado EVOA
(acrónimo de “Espaço de Visitação e Observação de Aves”), e diversas vias de
exploração pedestre.
Para chegar ao EVOA é necessário
percorrer uma dezena de quilómetros em estrada de terra batida. Ou seja, está
isolado das perturbações sonoras mais evidentes, como a indústria ou os
automóveis. Aqui podemos ouvir a natureza. No centro, para além de pagar a
entrada, podemos adquirir guias e a parafernália típica dos ornitólogos (guias,
binóculos, etc.) ou simplesmente consumir uma bebida no bar.
Os percursos que partem do EVOA prolongam-se
por diversos quilómetros e, nos locais mais adequados para a observação de
aves, existem observatórios. Para meu desgosto, que adoro a noite, o centro
encerra às 19 horas, o que impede de ver e ouvir a fauna noturna. Talvez este
seja o único ponto negativo do EVOA.
Nos Açores há diversos locais
esplêndidos para a observação de aves e muitos deles já estão também equipados
com observatórios. Na ilha do Corvo há mesmo um centro de interpretação
dedicado à ornitologia e um centro de recuperação de aves selvagens.
Apesar de ser impossível ver
dezenas de espécies de aves num dia, nos Açores há um conjunto muito particular
e que agrupo da seguinte forma: as endémicas, as aves marinhas e as aves de
arribação norte-americanas. As endémicas incluem o priolo de São Miguel, a
estrelinha de Santa Maria e o priolo-de-Monteiro da Graciosa. Quem quiser
observar estas aves ao vivo no seu habitat natural terá de se deslocar a estas
ilhas. No mundo inteiro, não há outra hipótese.
Nas nossas ilhas há diversas
espécies de aves marinhas. Algumas usam o nosso território para nidificar e,
por isso, podem aqui ser facilmente observadas nessa época. Para além do
cagarro, as diversas espécies de garajaus merecem particular referência. Podem
ser observadas noutros locais, mas a concentração e o comportamento que exibem
nos Açores têm paralelo em poucos locais.
Por último, as aves de arribação
norte-americanas. Estas não existem na Europa e apenas chegam aos Açores nos
dias de tempestade. São involuntariamente transportadas da América do Norte até
ao nosso território e, para os ornitólogos, constituem uma rara e valiosa hipótese
de ver espécies americanas em solo Europeu. Por ano, há umas dezenas de
observações com estas características. Durante o inverno, ultimamente, estes
turistas têm ocupado quase em pleno as unidades hoteleiras das Flores e Corvo.
Para os que, como eu, gostam de
aves e da sua diversidade, mas não são apaixonados, podem ser razoavelmente
indiferentes as observações que fazemos. Tenho uns quantos guias de aves nos
quais vou assinalando as observações mais relevantes. Nada mais do que isso. No
entanto, para os ornitólogos que hierarquizam o sucesso individual de acordo
com o número de espécies diferentes observadas, é fundamental aceder aos locais
onde podem acrescentar valor ao seu handicap. Para comparação, um clube
de futebol com sucesso tem cerca de 100 mil sócios pagantes e o maior clube dos
ornitólogos britânico, de nome Royal Society for the Protection of Birds, tem
um 1,1 milhões. É muita gente…
Há aqui um nicho muito
interessante e que os açorianos têm sabido cativar ao longo dos últimos anos. Mesmo
para os não ornitólogos, garanto que passar um final de tarde em comunhão com a
natureza e com a amigos a ver aves é um período muito bem passado!
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