sexta-feira, 27 de abril de 2012

Tubarões

Tubarão-azul ou tintureira observado ao largo do Faial.
Foto: Justin Hart – CW Azores

Uma das temáticas que mais tem fascinado os apaixonados do mar nos últimos tempos são os tubarões. Mas porquê? Na realidade é um grupo de espécies de peixes em que se cruzam grande parte dos nossos medos, culpas e fascínios.
O medo de tubarões legitima-se pelo aspeto agressivo destes animais, pelas mandíbulas polvilhadas de dentes afiados, pela real capacidade de magoar um ser humano e por causa de um célebre filme de muito má memória, principalmente para os tubarões...
E, portanto, somos culpados de uma perseguição injustificada e injustificável. Injustificada porque, todos os anos morre muito mais gente por causa das alforrecas ou cocos que caem das árvores, imagine-se, do que por ataques de tubarões. Nunca vi ninguém perseguir alforrecas e, muito menos, cocos… Mas tubarões… Já todos nós vimos descargas de toneladas deles e caçadas absurdas. Em resultado das capturas desmesuradas, há hoje muito menos tubarões que noutros tempos. Pior do que isso, nós somos culpados por ter permitido que, inclusivamente, estes animais fossem capturados em números inimagináveis apenas para lhes tirar as barbatanas. Nós, a humanidade, foi complacente com este facto durante tempo demais e daí o sentimento de culpa.
Desde que se compreendeu que este grupo estava em perigo que se intensificaram os estudos para o compreender. Com estes estudos cresceu o nosso fascínio comum pelos tubarões, tendo estes passado de predadores insaciáveis a vítimas extraordinárias. Estes animais, por exemplo, ocupam habitats completamente diferentes, têm alimentações que vão desde os plantófagos aos predadores de topo, têm métodos de reprodução que incluem, nalgumas espécies, predação intrauterina ou a capacidade de atravessar oceanos. Ecologicamente, os tubarões são essenciais para retirarem dos mares os animais menos aptos ou doentes. Sem tubarões, a seleção natural e a saúde das restantes populações seriam seriamente afetadas. Nós seríamos seriamente afetados.
No caso dos Açores, não há embarcações dedicadas a pescar tubarões. Infelizmente, na pesca de espadarte por palangre derivante há, assessoriamente, muitos tubarões capturados. Durante o Inverno, há mesmo mais tintureiras (uma espécie de tubarão) capturadas do que espadartes. Na zona exterior da subárea dos Açores da Zona Económica Exclusiva de Portugal, por uma decisão errada da Comissão Europeia, não há agora restrições ao número de embarcações que capturam tuba… oppsss… espadartes. Tudo isto me leva a crer que as populações de tintureira podem estar a sofrer um impacto elevado. Da mesma forma que eu, afirma-o a União Internacional para a Conservação da Natureza, uma das mais respeitadas organizações ambientais do mundo.
As capturas de tintureiras obtidas este ano parecem, no entanto, contrariar esta opinião. De facto, as capturas anormalmente elevadas podem indicar uma recuperação da população ou, como muito receio, “o canto do cisne”.
Basta olhar para um tubarão dentro de água, a nadar majestosamente no seu meio, para perceber que são animais dignos de veneração. E há muitas pessoas a pensar desta forma. São pessoas que são capazes de viajar desde o centro da Europa até aos Açores, pagando viagens, estadias e refeições e, ainda, cerca de 150 euros para ver tintureiras a nadar no azul transparente das águas açorianas. Estima-se que a atividade de observação de tubarões no nosso arquipélago irá crescer muito este ano. Por isso, grande parte das empresas que se dedicam à observação está a reforçar as suas flotilhas.
Ora, temos uma atividade que prejudica os tubarões, estes animais fascinantes e essenciais. Por outro lado, temos um conjunto muito interessante de europeus que querem pagar somas avultadas para vir até aos Açores observá-los enquanto nadam. Sendo o caso tão simples, qual é a opção correta?

2 comentários:

  1. Caro Frederico, como sempre um excelente artigo, escrito por quem está bem informado, e isso é fundamental. Lembro-me como se tivesse sido ontem desse arrepiante filme “JAWS”, com aquela impressionante música que nos fazia levantar o rabo na cadeira. Foi um dos maiores sucessos de bilheteira de todos os tempos, mas também, e infelizmente, um grande contributo para o empolamento da imagem do tubarão como um impiedoso comedor de homens. Nessa época houve quem nunca mais entrasse na água a não ser numa piscina, mas isso ficou para a história e essa não “reza” dos tolos. A realidade nua e crua mostra-nos hoje que ele afinal passou rapidamente de predador a presa, sendo-lhe movida uma caça sem tréguas, mesmo sabendo-se que se trata de um animal cuja existência se revela crítica para a sustentabilidade da vida no mar, e até na Terra, como ficou bem documentado no artigo. Não estou é muito de acordo que se meta no mesmo saco toda a humanidade quando se fala das capturas desmesuradas por um lado, e por outro quando se diz que "existe um sentimento de culpa". São coisas diferentes, vividas e sentidas por pessoas diferentes. Ironicamente quem terá esse sentimento de culpa será praticamente quem até nunca contribuiu para a "matança", e quando muito sente que poderia eventualmente ter tentado fazer algo em defesa desses maravilhosos animais, e não o fez. Isto obviamente que não se aplica a quem os continua a chacinar, no mar, nos gabinetes, ou nas instâncias superiores com poderes de decisão, defendendo a continuidade desse ato patético em nome de valores pouco claros (para uns, e muito claros para outros), e com base em pouca ou nenhuma informação ou, até, apenas naquela que lhe convém. Qual a opção? Por mim não teria dúvidas e poria em primeiríssimo lugar a preservação da espécie, já que não considero justificável o que se está a fazer, mas não tenho esse poder. Agora não será certamente com a criação de uma espécie de "santuário dos tubarões" num bocadinho de oceano aqui ou ali, porque essa certamente será uma solução que só sairá de uma cabeça muito pequenina, incapaz de abranger a magnitude do comportamento e interação dos tubarões no complexo sistema da cadeia alimentar a nível global. Nem sempre se poderá estar bem com Deus e com o Diabo ao mesmo tempo, nem sempre existem soluções de compromisso. Momentos há em que se tem que escolher um lado, tomar decisões, e corretas, pois o futuro da humanidade dependerá da capacidade que ela tenha de avaliar o impacto das suas ações, e não é muito propriamente nesse sentido que temos vindo a caminhar. Estou muito pessimista em relação ao anunciado estudo, em especial e por razões históricas, no que ao seu efeito prático diga respeito. Mas o futuro dirá de sua justiça.

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  2. Olá
    Porque não estudar-se a viabilidade da pesca do espadarte com o uso de arpão em vez do palangre, em embarcações com bem menos pessoal, mais pequenas e muito menos dispendiosas, na teoria a margem de lucro seria até maior.
    Isto é feito no mediterrâneo, na costa oeste e leste dos estados unidos e canadá.
    Eu tenho tentado encontrar informação no site regional de estatística para tentar estudar se este tipo de pesca seria viável, e o que observei é a frota de pesca ao espadarte está concentra em São Miguel e o outubro representa cerca de 30% das capturas do ano todo.
    Ou seja um autorização de pesca só para os meses significantes de pesca do espadarte, iria aumentar a eficiência de pesca, reduzir em mais de 50% as subcapturas de tartarugas e tubarões. Iria permitir que os pescadores locais de pesca de fundo com traineiras de 10 a 12m pescassem nesse mês, NOV E FEV ( outros 2 meses que representam 15% cada ) por motivos de mau tempo acho que não seria possível.

    Existiria a questão desses pescadores locais deixarem de pescar bonito em outubro, contudo outubro é um mês médio fraco e sem com contas feitas por alto seria mais rentável pescar espadarte nesse mês, já contando com a adaptação em equipamento necessário para a pesca de arpão (estrutura metálica e palamenta).
    Ainda mais a pesca só de bonito, não é uma pesca rentável por carga de trabalho, para uma pequena embarcação, seria mais eficiente para esse tipo de embarcação praticar pesca de fundo no inverno-primavera, final de primavera-inicio de verão pesca de patudo e voador, no verão patudo, voador e restantes, e no mês de outubro espadarte para encerrar.

    E claro a evolução seria a proibição do uso de palangre caso as embarcações pequenas-médias locais conseguissem atingir as quotas do espadarte previstas para a região. Assim deixaria-se de observar a um enorme gasto de combustível que as embarcações estrangeiras gastam para se deslocar aos açores, contribuindo para poluição dos mares e ao fim das subcapturas de tubarões e tartarugas nos mares dos açores.
    Cumprimentos
    JSilva

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