Jogo "Parlamentar" a ser testado.
Respeitando o conselho médico, andava eu pela cidade de
Bruxelas entretido entre a obtenção do número mínimo de passos obrigatórios por
dia e a esperança de ser surpreendido por qualquer coisa, algo que aqui
acontece com alguma frequência. Ok, não é Paris, Londres ou Nova Iorque, mas
não deixa de ter muitas pessoas, uma enorme diversidade de culturas e “boa
onda”, o que é metade da receita para a surpresa. Se hoje tinha esperança, não
fiquei desiludido.
Ao passar por um dos parques emblemáticos da cidade de
Bruxelas, o parque que foi edificado para celebrar os cinquenta anos deste
jovem país (relembro que a Bélgica tem pouco mais de 180 anos), reparei num
extenso conjunto de barraquinhas. Periodicamente, há neste parque eventos que
vão desde a festa medieval até à mostra de produtos portugueses, passando por
quase tudo o resto. No dia de hoje, o espaço estava ocupado pelo Festival de
Jogos de Bruxelas. Havia dezenas e dezenas de representações de empresas de
jogos de mesa ou jogos de sociedade, conforme preferirem. Os seus nomes davam
para cobrir todas as preferências, mas gostei especialmente das edições “Le Droit
de Perdre”. Expressa bem o único direito que um jogador tem. O jogador pode ter
o mérito de ganhar, mas tem certamente o direito de perder!
Cada uma destas empresas representava, expunha,
exemplificava e vendia de um a centenas de jogos. Por todo o lado havia mesas
com tabuleiros e, nas cadeiras em volta, sentavam-se amigos, famílias,
conhecidos e desconhecidos e mesmo alguns autores dos jogos. O ambiente era
fantástico. Desde o tradicional xadrez, passando por jogos de sensibilização
ambiental, como um jogo chamado “Fotossíntese”, ou outros complicadíssimos envolvendo
casas, castelos, guerreiros exemplarmente pintados em tabuleiros gigantes e que
eu não percebi como se jogavam…
Na maior das barraquinhas, já com tamanho suficiente para se
lhe chamar pavilhão, havia um espaço para teste de novos jogos. Os autores
estavam presentes com tabuleiros, fichas e cartazes, nitidamente preliminares daquilo
que um dia será um novo jogo de mesa, e desafiavam os transeuntes a
experimentar o seu protótipo. Segundo me explicaram é uma situação duplamente
ganhadora porque o transeunte tem uma experiência totalmente nova e os autores
podem afinar as regras, os desafios ou o design dos jogos. Parei por algum
tempo junto de alguns destes protótipos e testemunhei a curiosidade daqueles
que se submergiam nos “novos mundos” e os apontamentos que os autores iam registando
nos blocos de notas. Funcionava!
Um destes novos jogos chamava-se “Parlamenteur”. “Não é
possível”, pensei para com os meus botões… “um jogo sobre o Parlamento…”, sem
notar à primeira no detalhe do final do nome. Abordei um dos autores e
disse-lhe que era interessante terem feito um jogo sobre parlamentares e eu
trabalhar precisamente num parlamento, “não estava à espera”. O autor, embaraçado,
mas, ao mesmo tempo, divertido, respondeu-me que sabia que nem todos os
parlamentares eram mentirosos! Apenas aí caí em mim e reparei que o nome do
jogo era um trocadilho entre as palavras francesas “parlamentar” e “mentiroso”.
Ele explicou-me que o jogo se apoiava na mecânica das alianças que se formam
num parlamento para formar governo e fazer passar as leis para explicar como
funciona a democracia e alertar para como pode ser corrompida. “É um jogo muito
pedagógico e que pretende ajudar a formar cidadãos mais informados e atentos
aos detalhes do jogo político”. Os transeuntes que estavam a experimentar o
jogo pareciam empenhados na vitória dos seus partidos imaginários, tentando
obter as necessárias maiorias. Pelas palavras e pelos maneirismos, pareceu-me
que estes jogadores já estavam a dominar a arte de cativar pela abnegação dos
argumentos e pelo altruísmo dos objectivos que vou vendo no Parlamento Europeu.
Espero que o jogo saia depressa e uma coisa posso garantir, vão ter um cliente!
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