A crise consequente à pandemia de
covid-19 fez soar diversos alertas. Um deles foi a falta de alguns produtos
essenciais no velho continente. De repente, vimo-nos reféns dos países de mão
de obra barata.
Aquilo que parecia um movimento
internacional sinergético e estratégico, em que a União Europeia conservava as indústrias
tecnológicas melhor remuneradas e em que permitia que economias emergentes
beneficiassem do monopólio dos restantes produtos, revelou-se um desastre.
Perante a carência global de máscaras, reagentes para testes médicos e outros,
com legitimidade, os países produtores reservaram para si grande parte destes
produtos.
Correu mal. No país onde trabalho, na
Bélgica, por falta de reagentes não foi possível realizar testes à covid-19 em número
minimamente adequado. Sem saber quem tinha contraído o vírus, tornou-se
impossível controlar os diferentes focos, a doença proliferou e chegou aos
locais mais sensíveis, como os lares de terceira idade. Este país passou a deter
o triste título de maior número de mortes por habitante no planeta Terra.
Outros países da União Europeia tiveram problemas similares o que terá,
obrigatoriamente, de nos fazer pensar, planear e agir!
É necessário dar um passo atrás e
definir que produtos estratégicos terão de ser produzidos na Europa, mesmo que
isso nos custe mais. É uma questão de sobrevivência. Não podemos voltar a ficar
reféns de países terceiros, vendo o caos a instalar-se nos nossos territórios
e, impotentes, ver sofrer e morrer aqueles a quem mais queremos bem. Nunca
mais!
Noutra vertente, hoje, enquanto
escrevo estas linhas, a União Europeia ainda não tem uma aplicação para
telemóvel que rastreie os contactos de proximidade e alerte em caso de
contração da doença. Como é possível?! É evidente que as nossas legítimas
exigências em termos de respeito pela privacidade são diferentes das da China
ou das da Coreia do Sul, mas, tanto tempo…? Ainda por cima, a solução encontrada,
e que países como Portugal estão a utilizar, tem por base aplicações da Apple e
da Google. Faz isto sentido?! Num continente que tem a Tom-Tom, excelente em
soluções de mapeamento, e a Nokia, excelente em software para plataformas
móveis, por que razão o, potencialmente, mais importante instrumento de saúde
tem de ter por base empresas norte-americanas?! Nada contra os Estados Unidos
da América, antes pelo contrário, mas nós temos de ter a nossa autonomia,
independência e soberania também no que diz respeito à Saúde.
Alargando o campo de observação, as
maiores empresas do mundo são quase todas norte-americanas ou orientais.
Segundo uma lista a que tive acesso, das vinte gigantes tecnológicas mais
valiosas, apenas uma é europeia (trata-se da “SAP”, uma empresa alemã). De
entre as 20 maiores plataformas de mensagens ou redes sociais, zero têm sede na
União Europeia. Como foi isto possível?!
É necessário fortalecer as boas
empresas globais que temos, como a Airbus, Spotify, Unilever, IKEA, Lego ou as da
indústria automóvel, e estimular o empreendedorismo europeu para criarmos
alternativas em termos de sistemas operativos, soluções móveis, equipamentos
para a internet das coisas, reativar os têxteis, o calçado, recursos minerais, a
comida e todos os produtos relacionados com a saúde. Não podemos continuar
retraídos, apostando apenas na componente social das pequenas e médias
empresas, como tem sido feito. É importante, mas muito limitado para a nossa
própria segurança coletiva.
No início da pandemia, em tempo record, a Comissão Europeia conseguiu
repatriar 600 mil europeus que estavam bloqueados em países terceiros, no
período em que cessaram a maioria dos voos comerciais internacionais.
Repare-se, é o mesmo que, de repente, evacuar um país do tamanho do Luxemburgo.
Foi uma importante tarefa e desempenhada com nível de excelência. Precisamos
destes impulsos positivos e proativos!
Na minha opinião, da mesma forma que
a Comissão Europeia geriu bem as pontes aéreas que se instalaram para rapidamente
repatriar cidadãos europeus, tem de ser consequente, competente e inspiradora
para o que se seguirá. Há que fazer um plano que seja orientador e estimulante
para a indústria europeia. Isto diz respeito a matérias primas e produtos
manufaturados, mas também a serviços e até a redes sociais. Não bastam palavras
soltas. É preciso um extraordinário plano com potencial para ser
entusiasticamente seguido pelos diferentes níveis de governação e todas as
partes interessadas da União Europeia.
Ao mesmo tempo, é absolutamente crucial
que os cidadãos europeus compreendam que, também eles, fazem parte da mudança.
É essencial que nos disponibilizemos para comprar europeu, mesmo que isso custe
mais caro. Se queremos continuar a ter segurança social, proteção civil,
educação e boa qualidade de vida em geral, quando pensarmos em adquirir o novo telemóvel,
o novo carro ou o novo computador temos de pensar “Europa”!
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